A entrega das águas às corporações internacionais é conduzida a passos largos pelo governo golpista de Michel Temer.
Em janeiro, Michel Temer e o presidente da Nestlé, Paul Bulcke, se reuniram para discutir a exploração do Aquífero Guarani / MST
A sede da Nestlé em São Lourenço, Sul de Minas Gerais, foi ocupada
por 600 mulheres sem terra às 6 horas da manhã desta terça-feira (20).
As mulheres, que seguem na Jornada Nacional de Lutas, denunciam a
entrega das águas às corporações internacionais, conduzida a passos
largos pelo governo golpista de Michel Temer. Elas alertam para as
negociatas que ocorrem neste momento no Fórum Internacional das Águas,
em Brasília.
“Imagina você ser obrigada a comprar em garrafinhas toda a água para
matar a sede durante o dia. Ninguém aguentaria isso. É o que querem as
empresas reunidas nesse momento naquele Fórum”, aponta Maria Gomes de
Oliveira, da Direção do MST. “É muita petulância fazer um fórum
internacional para comercializar nossas reservas de água. Eles não estão
lá para debater gestão de nada, estão fazendo um leilão para vender o
país a preço de banana”, completa a dirigente.
Em janeiro deste ano Michel Temer e o presidente da Nestlé, Paul
Bulcke, se reuniram para discutir a exploração do Aquífero Guarani. A
reserva abrange quatro países. Após as vitórias dos conservadores na
Argentina e golpes de Estado no Paraguai e no Brasil, somente o Uruguai
poderia colocar empecilhos à privatização. “Quanto mais o golpe se
aprofunda, fica mais clara a influência de grandes grupos econômicos
sobre a política e seu interesse em explorar as nossas riquezas
naturais”, explica Oliveira.
Extração criminosa
A empresa, que controla 10,5% do mercado mundial de água, está
instalada na cidade desde 1994, quando comprou as fontes e o Parque das
Águas de São Lourenço. Desde 1997 a população local denuncia a
exploração das águas minerais que, antes de serem privatizadas, eram
amplamente utilizadas para tratamentos medicinais. Além da redução da
vazão, nota-se a mudança no sabor da água, ou seja, a exploração está
fazendo com que ela perca seus sais minerais.
O processo de envase leva ao mercado duas marcas, a São Lourenço e a
Pure Life. Esta última foi comercializada sem licença estadual de 1999
até 2004, quando o governo Aécio Neves (PSDB), presenteou a empresa com a
autorização. No entanto, uma ação civil pública contra a Nestlé apurou
que além de abrir ilegalmente o Poço Primavera e gerar a seca da fonte
magnesiana, a água produzida também era ilegal. A Nestlé fazia a
retirada de todo o minério do líquido através de um processo químico,
para em seguida adicionar sais minerais de sua própria patente.
“A Nestlé se instaurou aqui há décadas e por décadas faz a exploração
predatória e até irregular. A água é um bem comum da humanidade,
defendê-la é uma questão de soberania”, explica Maria. Apesar do
presidente da Nestlé afirmar que não há super exploração, duas das
fontes do parque já secaram. Segundo os dados oficiais deles, são
sacados 19 milhões de litros de água por ano. Como não há uma legislação
específica sobre o mercado, resta à União, ao município e ao Estado uma
compensação financeira. Em 2016, isso significou para São Lourenço,
trágicos 563 mil reais.
Escravocrata
O Sul de Minas Gerais é conhecido pela grande produção de café. A
Nestlé controla 22% das marcas de café no mundo, grande parte retirada
da região. O plantio convencional, dotado de altos níveis de
agrotóxicos, emprega milhares de trabalhadores irregulares anualmente.
Faltam fiscais do trabalho para controlar os abusos que ocorrem nas
fazendas cafeicultoras. Em 2015 dois adolescentes, um de 14 e outro de
15 anos, foram resgatados de Fazendas da Nestlé.
Marielle vive!
As mulheres sem terra reivindicam ainda a memória de Marielle,
exigindo justiça e punição aos responsáveis. “Não temos dúvidas de que
este Estado antidemocrático é inteiramente responsável pela execução da
nossa companheira. Marielle viverá sempre em nossa luta!”, afirma Maria.
As mulheres sem terra prometem continuar as lutas durante o ano.
Nesse sentido, Maria Gomes de Oliveira é taxativa. “Enquanto a burguesia
continuar impondo este rompimento democrático, condenando a população
brasileira à perda de direitos, vamos seguir ocupando terras, empresas e
propriedades para denunciar todos os articuladores do golpe. O povo
precisa saber quem são os responsáveis pela miséria, pela sua exploração
e pela destruição do meio ambiente”.
Em nota, a Nestlé diz que "respeita a liberdade de expressão e
opinião, mas lamenta que a manifestação tenha gerado danos nas
instalações, local de trabalho de cerca de 80 colaboradores". A empresa
afirma também que "está comprometida com a administração sustentável
dos recursos hídricos" e nega que tem planos de extração no aquífero
Guarani ou negocia o tema com o governo.
Edição: Juca Guimarães
Disponível em: https://www.brasildefato.com.br/2018/03/20/mulheres-ocupam-nestle-contra-a-privatizacao-das-aguas/
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