Artigo de Luis Miguel Modino sobre a análise de conjuntura feita pelo Pedro Ribeiro, e o olhar sobre os desafios da cidade apresentados pela Raquel Rolnik na manhã do segundo dia (24), do Intereclesial.
Conhecer a realidade nos leva a nos abrirmos às problemáticas comuns,
atitude inseparável de quem se diz cristão e ainda mais de quem vive
sua fé nas comunidades eclesiais de base. Não podemos nos fechar, pensar
em resolver só aquilo que nos atinge diretamente, somos obrigados a
olhar longe, tanto no espaço como no tempo.
Muitos se perguntam pelos motivos da situação que o mundo e o Brasil
passa e podemos dizer, como reconhecia Pedro Ribeiro de Oliveira, que no
fundo da crise está a “falência” do sistema capitalista, que está
acabando nem só com a vida das pessoas, como de um Planeta que já está
doente, chegando a se perguntar com preocupação: em que mundo vão viver
nossos netos? As CEBs são desafiadas a tomar consciência da situação e
pedir perdão pelos pecados que cometemos contra a natureza, que está em
guerra contra as grandes empresas e que nos torna em vítimas.
O golpe que o Brasil sofreu, e que já se deu anteriormente em outros
países da América Latina, foi promovido pelos interesses do capital, de
olho nos recursos naturais, no minério, no petróleo, na água… O Brasil
chegou numa situação que até a própria Constituição é mudada segundo os
desejos da classe dominante.
Não podemos fechar os olhos, temos que ser conscientes que a
concentração da riqueza em poucas pessoas tem concentrado o poder, onde
hoje tem um papel determinante o controle da informação, sobretudo pelos
Estados Unidos, que gera noticias segundo o próprio interesse, mesmo
que para isso seja preciso agir desde a mentira, inclusive sabendo que
isso provoca guerras, uma das realidades mais presentes no mundo atual,
diante da qual as CEBs são desafiadas a procurar e fomentar caminhos de
paz.
Vivemos num mundo que tem mudado os valores, provocando um câmbio de
ideais. Hoje é valorizado a competição, o progresso, a eficiência, o
avanço, deixando de ser importante outros aspectos como democracia ou
justiça. Diante de situações como o julgamento do Lula, se percebe essa
mudança, até o ponto de poder dizer que estamos diante de um processo
próprio da Santa Inquisição, com uma sentença já determinada.
Segundo Pedro de Oliveira, se faz necessário empreender ações a curto
e longo prazo, começando por um processo de conscientização, que ajude a
superar um sistema de alienação, onde o único que interessa é ter
dinheiro no bolso, aspecto em que também insistia Raquel Rolnik. Para
isso as CEBs contam com o método de Paulo Freire e a leitura popular da
Bíblia como instrumentos. Junto com isso é preciso descobrir as
escravidões de hoje, recuperar as lutas e escutar os gemidos da Mãe
Terra e dos pobres.
Isso pode ajudar a construir novos caminhos, pois esse é o desafio,
segundo Raquel Rolnik. Em sua análise, ela mostrava que na cidade se
concentra o poder, mas também aqueles que lutam para fazer parte da
sociedade, para ter acesso à riqueza. Nesse sentido, a migração para a
cidade tem marcado a vida do Brasil nos últimos 60 anos. No primeiro
intereclesial esse fenômeno marcava a sociedade brasileira, gente do
interior que ia para a cidade em busca de oportunidades, muitas vezes
forçados por processos de expulsão, fenômeno que hoje continua presente
na Amazônia ou no Centro Oeste.
Foi esse povo da base quem foi construindo a cidade a partir da
solidariedade, tendo a Igreja um papel fundamental nessa construção do
tecido sociopolítico. O povo era explorado como mão-de-obra barata pelas
multinacionais, situação que hoje se repete. Diante disso, o povo foi
para a luta, se concretizando esses desafios na Constituição de 1988.
Podemos falar, segundo Rquel Rolnik, de uma época de cidadania
insurgente, que procurou a conquista de direitos.
Nesse sentido, temos que ser conscientes que conhecer o passado nos
ajuda entender o presente. A professora da USP, destaca alguns fenômenos
que mudaram essa realidade, como as novas igrejas evangélicas, que
promoveram outros valores ou a mudança nos partidos políticos que
construídos a partir das lutas mudaram e se colocaram ao serviço dos
grandes interesses e que teve como consequência a corrupção, fazendo que
o destino da cidade continue nas mesmas mãos. Podemos dizer, segundo
ela, que os “territórios populares” foram invadidos pelos corruptores.
A sociedade atual está determinada pelo capital, que circula
livremente, enquanto as pessoas cada vez têm mais dificuldades para ir
de um lugar a outro, especialmente os mais pobres. Hoje os fundos de
investimento se tornaram em elemento que decide a vida social. Diante
disso, onde fica o papel do Estado? Muitos chegam a afirmar que não
precisamos mais de Estado.
Isso tem que nos levar a descobrir que é momento de voltar para os
territórios, para comunidades organizadas, que constroem sua vida desde
um espaço de debate, que gera um movimento de popular de
autodeterminação, que faz desfrutar dos pequenos, daquilo que nos leva
às mudanças. Essa é a utopia onde queremos chegar, mas para isso devemos
construir novamente a sociedade a partir do aprendido das lutas ao
longo da historia, vamos chegar na utopia.
Disponível em: http://portaldascebs.org.br/2018/01/25/um-sistema-falido-que-tem-que-nos-levar-a-reconstruir-utopias/
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