O Jantar de Temer
- Leonardo Sakamoto
Temer
vai oferecer um jantar para deputados de sua base aliada na noite desta
quarta (22). O objetivo é buscar formas de convencer 308 parlamentares a
engolirem uma Reforma da Previdência, mesmo reduzida em relação à
proposta original, a poucos meses da abertura do calendário eleitoral.
Ou seja, da época em que muitos políticos lembram-se da população.
Logo de cara, ele muda os garçons.
Bruno
Araújo (PSDB-PE) deixa o Ministério das Cidades e em seu lugar ficará
Alexandre Baldy (hoje, sem partido), próximo de Rodrigo Maia, presidente
da Câmara. O ministério é uma das ”galinhas dos ovos de ouro” da
administração federal, sendo fundamental para ajudar deputados a se
reelegerem através da liberação de recursos para obras e programas
que beneficiam seus eleitores.
Para
lugar de Antonio Imbassay (PSDB-BA), chegou a ser indicado Carlos Marun
(PMDB-MS) como ministro-chefe da Secretaria de Governo, responsável
pela articulação política do Palácio do Planalto com o Congresso
Nacional. Marun é líder da tropa de choque de Temer na Câmara, relator
da CPMI da JBS e, o mais importante, amigão de Eduardo Cunha – tendo
visitado o ex-presidente da Câmara dos Deputados na prisão em Curitiba.
Mas diante da reclamação de parte do PSDB, a substituição ainda está
sendo costurada e Imbassay permanece no cargo.
No
cardápio, desta vez, emendas e entrega de cargos não devem ter um
espaço tão grande quanto em outros jantares em que Temer participou.
Afinal de contas, a coisa pública já foi amplamente rapinada.
Por
exemplo, em agosto e outubro, jantares foram organizados pelo deputado
Fábio Ramalho (PMDB-MG) antes das votações das duas denúncias contra
Temer – por corrupção passiva, organização criminosa e obstrução de
Justiça. Encaminhadas pela Procuradoria-Geral da República, elas foram
negadas pela Câmara após o Brasil presenciar cenas despudoradas de
compra de votos a céu aberto.
Ou
quando Temer organizou um jantar para deputados e senadores em nome da
aprovação da PEC do Teto dos Gastos – que congelou por 20 anos novos
investimentos em áreas como educação e saúde pública – em outubro do ano
passado. A aprovação da Reforma Trabalhista, por sua vez, foi
pavimentada por outros rega-bofes, alguns mais íntimos, outros coletivos
com o presidente.
Dizem que Temer consegue apoio do Congresso porque ”trata bem e ouve” os parlamentares. Disso eu não tenho dúvida.
Mas
se o Brasil é grande, o cardápio para convencer deputados de suicídio
político ao apoiar uma Reforma da Previdência que tramita sem o devido
debate público e que, por conta disso, é menos impopular apenas que o
próprio Temer, também tem que ser atrativo. A Previdência precisa ser
discutida e aprimorada para redução de desigualdades, mas do jeito em
que está sendo feito, a toque de caixa, importantes discussões estão
indo para o vinagre.
E
o ocupante do Palácio do Planalto não tem entregado apenas recursos e
posições para aliados em seu governo, mas também dado apoio para a
aprovação de medidas executivas e projetos de leis que beneficiem os
parlamentares ou seus patrocinadores. Mesmo que isso vá de encontro à
nossa Constituição Federal, à Declaração Universal dos Direitos Humanos e
tratados assinados pelo país no exterior e ao bom senso.
Um
item do cardápio na segunda votação para livrar o pescoço de Temer da
denúncia da PGR foi a polêmica portaria que tinha como objetivo
dificultar a libertação de trabalhadores escravizadas. Ele foi um agrado
às empresas do setor da construção civil responsabilizadas por trabalho
escravo e à bancada ruralista.
Outros
itens do menu são os perdões bilionários de multas e juros de impostos
aos grandes produtores rurais e por grandes empresários, seja através
de mudanças na cobrança patronal do fundo de aposentadoria rural (depois
reclamam do ”rombo” da Previdência Social…) ou pela aprovação de um
novo refinanciamento de dívidas com o poder público (Refis), que
beneficiou de forma bilionária os parlamentares-empresários.
Dizem
que um desses jantares promovidos por Temer contava com salada com
molho agridoce, risoto de shitake, filé ao molho madeira, salmão
grelhado, legumes ao vapor e pene com tomate seco. De sobremesa, frutas,
pudim de tapioca e goiabada com queijo. E para beber, Chadornnay, Casa
Vadulga e o Norton Cabernet Sauvignon. Além de água e refrigerantes.
Errado.
No menu estava a grande maioria da população brasileira, que vem
perdendo direitos em nome da implementação de medidas para acabar com a
crise econômica, enquanto a parcela mais rica da população segue tendo
seus privilégios inalterados. Traduzindo: o andar de baixo está comendo
mais acém com osso enquanto o de cima controla o frigorífico.
Não
fiquei sabendo que em algum desses jantares foi oferecida a taxação de
dividendos recebidos por ricos sócios de grandes empresas. Ou a criação
de novas alíquotas de Imposto de Renda de 35% e 40% para quem ganha
muito. E sabe o porquê? Porque provocaria uma enorme indigestão nos
senhores parlamentares que pensam primeiro neles, depois nos seus e o
povo que se foda.
Contra
o cardápio medonho que atinge o bolso e os direitos do povão, não ouvi
bateção de panelas. Não acredito que estejam cozinhando remorso, então
devem voltado à sua função original.
Independentemente
se você era contra ou a favor do impeachment ou fazia parte da imensa
maioria que não tomou partido e assistiu a tudo bestializado pela TV,
deve estar agora assando sua insatisfação temperada com desalento,
impotência, desgosto e cinismo. Essa panela de pressão pode não estourar
em manifestações com milhões nas ruas, mas tem tudo para ser bomba que
vai explodir invariavelmente em algum momento, talvez nas eleições
presidenciais do ano que vem, ferindo de morte a democracia.
Fonte: Blog do Sakamoto
Disponível em: http://www.intersindicalcentral.com.br/voce-jantar-de-temer-reforma-da-previdencia/#.WhyN6DdrzIU
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