Roberto Leher, Reitor da UFRJ
Via Nocaute:
Esta
proposta de emenda constitucional preocupa muito a Universidade
brasileira e a educação pública de uma forma geral e, podemos ampliar, a
própria concepção de Estado Social no país.
Porque
a PEC 241 tem como objetivo o congelamento de gastos num contexto em
que a taxa de juros vai aumentando o bolo tributário destinado ao
pagamento de juros e serviço da dívida. O que significa congelar,
portanto? Permitir o aumento permanente de gastos com a dívida, e ao
mesmo tempo teremos que reduzir drasticamente os gastos com o Estado
Social.
Tanto
é verdade que os próprios estudiosos que vêm propondo esta medida, como
os intelectuais conservadores organizados na Casa das Garças, como o
economista Edmar Bacha, de que é necessário modificar a Constituição
para que o ajuste fiscal tenha o alcance e a profundidade necessários.
O
que que significaria hoje mudar a Constituição? Fundamentalmente o fim
da gratuidade das universidades públicas; teríamos a desvinculação de
receitas tributárias para a educação e saúde, uma redução da
universalidade do SUS, o que significa obviamente que o SUS deixaria de
ser um sistema universal, e a desvinculação dos benefícios sociais da
seguridade em relação ao salário mínimo. Em suma, um conjunto de medidas
que expressa de forma contundente uma quebra nos principais direitos
sociais assegurados na Constituição Federal de 1988.
Então,
estaremos dentro de um contexto de muita diversidade para os direitos
sociais do país, e a educação pública seguramente em risco.
Um
cenário catastrófico, porque a expectativa da área econômica é de que
com o congelamento nós teremos uma redução dos gastos públicos da ordem
de 1,5% do PIB num espaço de dois anos. Então, pensando aí num cenário
de dez anos teríamos, por baixo, uma queda de gastos sociais da ordem de
7 a 8% do Produto Interno Bruto, o que obviamente inviabiliza toda
possibilidade de manutenção de um sistema público de educação, de saúde,
previdência social, enfim das políticas sociais de uma forma geral.
É
importante destacar que hoje o gasto educacional no Brasil – todo o
gasto, somando os municípios, os estados, tudo – temos aproximadamente
5,5% do Produto Interno Bruto. Então, dá para imaginar a escala do que
significaria hoje termos uma perda de verbas públicas da ordem de 7% do
PIB num prazo de dez anos.
Diante
de um quadro de corte dessa proporção, como está previsto pela PEC, nós
teremos seguramente dificuldade de manter as universidades como
instituições públicas, e esse é o objetivo.
É
por isso que quando apresentaram o planejamento da PEC 241 já estava
previsto no debate e no encaminhamento político dos defensores dessa
medida, o fim da gratuidade.
Em
outras palavras, como o Estado deixaria de financiar as universidades
públicas, teríamos um peso crescente do custeio feito pelos próprios
estudantes. O que é uma aberração em termos dos princípios
constitucionais e republicanos, porque temos outras alternativas para
cobrança de mensalidades, como por exemplo uma tributação proporcional à
renda e ao patrimônio. O imposto progressivo responderia às
necessidades de receitas para a manutenção das universidades.
É
importante destacar que isso no Brasil tem repercussões graves, não só
na formação humana, mas também na produção do conhecimento, na medida
que o grosso da ciência no Brasil é desenvolvido, o fundamental da
ciência no Brasil é desenvolvido hoje nas universidades públicas. Que
são responsáveis por mais de 85% da pesquisa no Brasil.
Então,
desmontar a universidade pública significa também desmontar toda a
expectativa de futuro em relação à ciência e tecnologia. Os povos
necessitam de conhecimento, necessitam de ciência, de tecnologia para
poderem forjar uma outra perspectiva para o bem viver.
Temos
desafios estruturais hoje na humanidade, como as mudanças climáticas
globais, o futuro da água, os recursos hídricos de uma forma geral. Nós
temos desafios no campo da energia, da educação básica, da saúde
pública, temos as viroses se espalhando pelas diversas partes do
planeta. E precisamos ter ciência para entendermos como é que funciona a
zika, como é que podemos atuar, produzir fármacos, vacinas, etc.
Todos
os povos precisam de conhecimento, enfim, para ter uma melhor
intervenção na natureza, na sociedade, e isso vai colocar o país numa
situação profundamente neocolonial. Tal como aconteceu no colonialismo
na África, em que as universidades foram fechadas, foram impedidas de
vicejar, nós teremos uma situação na mesma proporção, caso de fato essa
PEC seja aprovada. Seria um processo de desmonte profundo da educação
pública e de um precioso patrimônio que temos, do povo brasileiro, que
são suas universidades públicas.
Disponível em: http://www.debateprogressista.com.br/pec-241-prenuncia-o-fim-das-universidades-publicas-afirma-reitor-da-ufrj/
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