A Câmara dos Deputados vai votar a proposta que muda
a Constituição Federal para impor um teto ao crescimento nos gastos
públicos. Com isso, o montante que o governo pode gastar será reajustado
pela inflação do ano anterior, o que significa que os recursos para
implantar novas ações serão limitados. Se a educação e a saúde públicas
fossem exemplares, vá lá. Mas falta muito para alcançarmos a linha de
dignidade.
Ou seja, ao contrário dos contorcionismos, malabarismos
e truques de mágica que o governo Temer faz com as palavras para que
você acredite que nada vai acontecer, essa medida irá impactar os
investimentos nessas áreas fundamentais, a partir de 2018 e pelas
próximas duas décadas.
Atrelar o crescimento de gastos em educação
e saúde à inflação tem um efeito cumulativo sentido ao longo do tempo.
Talvez nem seja você a sentir a paulada, mas seus filhos e netos.
O
aumento da destinação de recursos em educação e saúde tem ocorrido
acima da inflação nas últimas décadas – em parte para responder às
demandas sociais presentes na Carta Magna de 1988 e, consequentemente,
tentar reduzir o imenso abismo social do país. Se o reajuste tivesse
sido apenas pela inflação, o tamanho da oferta de serviços não
cresceria, permanecendo tudo como estava.
Como já disse aqui,
ninguém nega que o déficit público precisa ser equacionado e que
soluções amargas devem ser propostas e discutidas. E todos terão que dar
sua contribuição, ricos e pobres. Mas Michel Temer, seu porta-voz
Henrique Meirelles e centenas de congressistas demonstram um carinho
grande com o andar de cima ao propor uma medida que limitará gastos que
mexem diretamente com a qualidade de vida dos mais pobres e evitam
aplicar remédios amargos entre os mais ricos.
Falar de aumento de
impostos aos mais ricos é um pecado inominável nos dias de hoje. Propor a
taxação de dividendos recebidos de empresas é crime. Defender a
alteração na tabela do Imposto de Renda (criando novas alíquotas para
cobrar mais de quem ganha mais e isentando a maior parte da classe
média) é um aberração. Isso sem falar que discutir a regulamentação do
imposto sobre grandes fortunas e o aumento na taxação de grandes
heranças (seguindo o modelo norte-americano ou europeu) é passível de
exílio.
Afinal de contas, debater formas de reduzir a desigualdade
crônica sempre foi caso de linchamento ou empalamento em praça pública.
Ou, pior: caso se polícia.
Essas medidas sozinhas não resolvem a
bancarrota para a qual caminhamos por conta do governo Dilma, mas
sinalizaria algo importante: que o país não é mais um lugar no qual os
lucros são privatizados pelos mais ricos e os prejuízos são entregues
aos mais pobres.
O governo ao invés de buscar medidas que
amortecessem o sofrimentos dos mais pobres, que são os que mais sentem
uma crise econômica, tenta preservar quem não precisa ser preservado.
Eu,
se fosse você, lembraria muito bem dos rostos e nomes dos deputados
federais e senadores que votarem a favor da Proposta de Emenda
Constitucional 241, tal qual vocês também lembram dos políticos
condenados por corrupção.
Se tiverem a cara de pau de abrirem a
boca para dizerem que defendem educação e saúde na campanha eleitoral de
2018, condene-os ao esquecimento. Ou os denuncie por propaganda
enganosa.
Sobre o autor
Leonardo Sakamoto
É
jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo.
Cobriu conflitos armados em diversos países e o desrespeito aos
direitos humanos no Brasil. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi
pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova
York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É
diretor da ONG Repórter Brasil e conselheiro do Fundo das Nações Unidas
para Formas Contemporâneas de Escravidão.
Disponível em: http://blogdosakamoto.blogosfera.uol.com.br/2016/10/10/pec-241-deputados-terao-coragem-de-dizer-que-defendem-educacao-e-saude/
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