Às vezes ouvimos pessoas falando em nome da “igreja”, como se ela
fosse uma só, monolítica e onde alguém pode tomar o lugar de porta voz e
dar a sua opinião como se ela, a pessoa, fosse o que a Igreja recebeu
dos Apóstolos e sempre creu. Quais são as implicâncias deste tipo de
afirmação? Outra questão é, se é vontade da igreja (a pequena, a local),
sempre é, por conseguinte, a vontade de Deus? Acaso não há conjuntura
histórica ou preferências pessoais que entram em jogo dentro de uma
igreja? Deus fala apenas na igreja (e/ou na Igreja)? Apenas nos lideres
dela? Se sua resposta for sim, como fica a afirmação bíblica de que “o
Espírito sobra onde quer”? E como compreender que “Deus fala pela boca
dos mais pequenos”? Como compreendemos que “Deus escolhe o fraco para
confundir os fortes”? A profecia mariana de que “Deus derruba dos tronos
os poderosos e eleva os humildes”, se realiza ou não?, que fazemos com a
diversidade de vozes e opiniões divergentes dentro da mesma igreja?
Alguns/as responderão à voz divina e outros não?
A relação fé e política sempre foi complicada. Por isso historicamente existiu tanta tensão entre ambas. Isso se deve a diversos fatores. Primeiro, a certa abstração da própria fé, como se fosse um elemento desencarnado da realidade, esvaziada de seus avatares e complexidades. Segundo, a uma visão reducionista da política, como se implicasse só no exercício burocrático partidário, e não um compromisso com as dinâmicas gerais e demandas do conjunto da população, com o bem comum; e depois, a dificuldade que tem tanto a fé ou o religioso e a mesma política em lidar com a pluralidade, a diferença e a heterogeneidade.
Apelar para a fórmula de “vontade divina” é uma muito perigosa espada de dublo gume: primeiro, para legitimar e absolutizar uma posição particular, e segundo, para silenciar a dissidência. Já a história nos contou, a preço de sangue e sofrimento, o que a aplicação deste reducionismo teológico significou como ferramenta de uma perversa e pervertida leitura política e social.
Não pretendo fazer uma explanação bíblico-teológica sobre o tema, porém vale dizer que nós merecemos um profundo reposicionamento sobre estes discursos, que partem de uma mútua alimentação entre estreiteza teológica e estreita análise política.
A democracia tem a ver com a construção de um espaço plural onde se reconhece a diversidade de opiniões e vozes. Este postulado se transforma em critério ético já que
tais posicionamentos formarão parte deste espaço na medida em que reconheçam sua necessidade do outro (e com ele sua própria contingência), e da maneira em que possibilitem seu lugar e o escutem. Por ser critério ético, precisamente não todos podem ser chamados democráticos (por exemplo, um processo ditatorial que aniquila o adversário ou um sistema político que fomenta a desigualdade em todo nível, não podem ser compreendidos como marcos facilitadores do lugar do outro).
Tudo isto não se gesta sem conflito, sem desacordo. “Acontece nas melhores famílias”, como reza o ditado. Apelar para a diversidade não significa uniformidade de opinião. Porém ele tampouco implica ser inimigos, mas sim só oponentes ou adversários que debatem e discutem desde diversos pontos de vista em torno a como responder às demandas que temos como grupo social.
Voltando ao tema que nos convoca, como compreender a partir da fé a diversidade e o conflito inerente às opiniões políticas dentro de um espaço democrático? Simplesmente fomentando-as e alimentando-as. Se existe vontade divina –tal como vemos plasmado no texto bíblico de “dente por dente”- é que o diverso sempre se exalta e se contrapõe a qualquer poder centralizador, a qualquer lei estabelecida e a toda prática cegamente absolutizada. O ser humano enquanto corpo é posto como epicentro de qualquer crença. Parafraseando a Jesus (Mc 2.27), a política está feita para as pessoas, e não as pessoas para ser encaixadas em um só modelo ou prática política.
A busca da vontade divina não significa encontrar uma resposta ideológica única ao que cremos como solução dos problemas sociais, desde uma dinâmica de “linha vermelha” com Deus. Implica, ou melhor, fomentar a reflexão e a sensibilidade sobre aqueles elementos que nos desafiam como sociedade, e o compromisso que temos de encontrar soluções como cidadãos/as crentes que compartimos em comunidade com outros/as. Para isso, existirão diversas respostas segundo as opiniões, subjetividades e posicionamentos políticos.
A fé é amor. É a busca do bem estar do próximo. Tudo o mais, deve apontar a este propósito. E para isso, a diferença, a discussão e o desacordo são necessários como caminho para aprender a aprender. Promover uma resposta única de parte de Deus significa encapsular a dinâmica da fé, através da anulação do outro, do diverso, do que opina de modo distinto. É tentar anular a Presença e o agir de Deus no mundo e, entre os cristãos, é dar um anti (ou contra) testemunho da fé cristã.
A pergunta é, se Jesus Cristo fosse eleito deputado, vereador ou prefeito, agiria como agem aqueles que dizem ser de “sua bancada”?
Não nos encerremos em arengas pessoais abdicando de ser conhecedores da direção da mão de Deus. Permito-me dizer que isso pouco tem a ver com a fé no Divino, cujo Mistério nos transcende e nos impossibilita encerrá-lo em uma opinião política ou até mesmo em uma doutrina religiosa. Fomentemos o diálogo, prática que como humanos que somos certamente se caldeará por momentos. Porém não temamos. Se todos/as reconhecemos que o fim é o bem estar do próximo, aprenderemos uns com os outros no caminhar compartilhado. E aí sim estaremos, de fato, procurando fazer a Vontade de Deus. Se não, apenas estaremos usando a política para manifestar a nossa vaidade e o quanto somos egoístas e, portanto, estamos longe de Deus e do que Ele realmente quer para o mundo, ou para nossa cidade.
A relação fé e política sempre foi complicada. Por isso historicamente existiu tanta tensão entre ambas. Isso se deve a diversos fatores. Primeiro, a certa abstração da própria fé, como se fosse um elemento desencarnado da realidade, esvaziada de seus avatares e complexidades. Segundo, a uma visão reducionista da política, como se implicasse só no exercício burocrático partidário, e não um compromisso com as dinâmicas gerais e demandas do conjunto da população, com o bem comum; e depois, a dificuldade que tem tanto a fé ou o religioso e a mesma política em lidar com a pluralidade, a diferença e a heterogeneidade.
Apelar para a fórmula de “vontade divina” é uma muito perigosa espada de dublo gume: primeiro, para legitimar e absolutizar uma posição particular, e segundo, para silenciar a dissidência. Já a história nos contou, a preço de sangue e sofrimento, o que a aplicação deste reducionismo teológico significou como ferramenta de uma perversa e pervertida leitura política e social.
Não pretendo fazer uma explanação bíblico-teológica sobre o tema, porém vale dizer que nós merecemos um profundo reposicionamento sobre estes discursos, que partem de uma mútua alimentação entre estreiteza teológica e estreita análise política.
A democracia tem a ver com a construção de um espaço plural onde se reconhece a diversidade de opiniões e vozes. Este postulado se transforma em critério ético já que
tais posicionamentos formarão parte deste espaço na medida em que reconheçam sua necessidade do outro (e com ele sua própria contingência), e da maneira em que possibilitem seu lugar e o escutem. Por ser critério ético, precisamente não todos podem ser chamados democráticos (por exemplo, um processo ditatorial que aniquila o adversário ou um sistema político que fomenta a desigualdade em todo nível, não podem ser compreendidos como marcos facilitadores do lugar do outro).
Tudo isto não se gesta sem conflito, sem desacordo. “Acontece nas melhores famílias”, como reza o ditado. Apelar para a diversidade não significa uniformidade de opinião. Porém ele tampouco implica ser inimigos, mas sim só oponentes ou adversários que debatem e discutem desde diversos pontos de vista em torno a como responder às demandas que temos como grupo social.
Voltando ao tema que nos convoca, como compreender a partir da fé a diversidade e o conflito inerente às opiniões políticas dentro de um espaço democrático? Simplesmente fomentando-as e alimentando-as. Se existe vontade divina –tal como vemos plasmado no texto bíblico de “dente por dente”- é que o diverso sempre se exalta e se contrapõe a qualquer poder centralizador, a qualquer lei estabelecida e a toda prática cegamente absolutizada. O ser humano enquanto corpo é posto como epicentro de qualquer crença. Parafraseando a Jesus (Mc 2.27), a política está feita para as pessoas, e não as pessoas para ser encaixadas em um só modelo ou prática política.
A busca da vontade divina não significa encontrar uma resposta ideológica única ao que cremos como solução dos problemas sociais, desde uma dinâmica de “linha vermelha” com Deus. Implica, ou melhor, fomentar a reflexão e a sensibilidade sobre aqueles elementos que nos desafiam como sociedade, e o compromisso que temos de encontrar soluções como cidadãos/as crentes que compartimos em comunidade com outros/as. Para isso, existirão diversas respostas segundo as opiniões, subjetividades e posicionamentos políticos.
A fé é amor. É a busca do bem estar do próximo. Tudo o mais, deve apontar a este propósito. E para isso, a diferença, a discussão e o desacordo são necessários como caminho para aprender a aprender. Promover uma resposta única de parte de Deus significa encapsular a dinâmica da fé, através da anulação do outro, do diverso, do que opina de modo distinto. É tentar anular a Presença e o agir de Deus no mundo e, entre os cristãos, é dar um anti (ou contra) testemunho da fé cristã.
A pergunta é, se Jesus Cristo fosse eleito deputado, vereador ou prefeito, agiria como agem aqueles que dizem ser de “sua bancada”?
Não nos encerremos em arengas pessoais abdicando de ser conhecedores da direção da mão de Deus. Permito-me dizer que isso pouco tem a ver com a fé no Divino, cujo Mistério nos transcende e nos impossibilita encerrá-lo em uma opinião política ou até mesmo em uma doutrina religiosa. Fomentemos o diálogo, prática que como humanos que somos certamente se caldeará por momentos. Porém não temamos. Se todos/as reconhecemos que o fim é o bem estar do próximo, aprenderemos uns com os outros no caminhar compartilhado. E aí sim estaremos, de fato, procurando fazer a Vontade de Deus. Se não, apenas estaremos usando a política para manifestar a nossa vaidade e o quanto somos egoístas e, portanto, estamos longe de Deus e do que Ele realmente quer para o mundo, ou para nossa cidade.
Dom Abade Antônio
Mosteiro Domus Mariae
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