O novo ministro da Justiça, Osmar Serraglio, durante entrevista em seu gabinete
RANIER BRAGON
CAMILA MATTOSO
DE BRASÍLIA
CAMILA MATTOSO
DE BRASÍLIA
Ligado ao agronegócio,
o novo ministro da Justiça, Osmar Serraglio, disse que os envolvidos em
conflitos no campo deveriam parar com a discussão sobre terras, que
segundo ele "não enchem barriga de ninguém". Para o peemedebista, que
assumiu o cargo na terça (7), o que importa aos indígenas é ter "boas
condições de vida".
"O que acho é que vamos lá ver onde estão os indígenas, vamos dar boas
condições de vida para eles, vamos parar com essa discussão sobre
terras. Terra enche a barriga de alguém?", disse o ministro em
entrevista à Folha.
Serraglio insinuou que ONGs do setor estão desviando dinheiro público.
"Ouço muito essas ONGs levando dinheiro, inclusive dinheiro oficial na
saúde. A saúde do indígena. Eu vejo, você vê, os indígenas são tratados
quase como uns animais".
Questionado se estava se referindo a desvios, Serraglio disse que a CPI
da Funai, em andamento na Câmara e dominada por ruralistas, vai
"surpreender".
O ministro afirmou que não escolherá nenhum lado na batalha entre
ruralistas e índios e fala em pacificar a crise no campo usando a
Constituição. Ele defende interpretações da Carta de 1988 e decisões
posteriores do STF mais benéficas aos ruralistas.
Cerca de 30% das doações de campanha de Serraglio em 2014 foram de
empresas ligadas ao campo. Ele foi relator da PEC 215, uma proposta de
emenda à Constituição que altera o sistema de demarcação de terras
indígenas.
Na manhã seguinte em que tomou posse como ministro da Justiça, o
peemedebista recebeu em seu gabinete a primeira visita de colegas
deputados, da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA).
"É evidente que ele não vai escolher lado porque ele só tem um lado, o
do agronegócio. Ele sempre foi um deputado atuante da bancada ruralista.
Para o índio, a terra é um elemento central, ela não só enche a barriga
mas enche também o sentido da vida para os indígenas", disse o
secretário-executivo do Cimi (Conselho Indigenista Missionário), Cleber
César Buzatto.
Para ele, a tese de Serraglio sobre a Constituição é uma estratégia dos
ruralistas para inviabilizar as demarcações de terras indígenas.
"Os índios não estão preocupados em encher a barriga, estão preocupados
em ter suas terras demarcadas e respeitadas", afirmou o ex-presidente da
Funai e sócio-fundador do Instituto Socioambiental (ISA), Marcio
Santilli.
Em novembro do ano passado, em uma decisão incomum, a Casa Civil da
Presidência da República mandou devolver à Funai 13 processos de
demarcação de terras indígenas que aguardavam homologação presidencial,
como revelou a Folha.
Os processos aguardavam assinatura ou do presidente Michel Temer ou do
então ministro da Justiça, Alexandre de Moraes. Eles se referem a 1,5
milhão de hectares em 11 Estados reivindicados por índios de 17
diferentes etnias. A maioria foi aberta entre os anos de 2004 e 2014.
O Ministério da Justiça também devolveu à Funai outros seis processos em
fase de identificação, uma etapa anterior à homologação.
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