Dois fatos havidos no Congresso Nacional nessas últimas
duas semanas antes do recesso parlamentar chamaram a atenção, pela
contradição que encerram consigo.
A Câmara dos Deputados aprovou o chamado regime especial
para as empresas do setor petrolífero (RePetro), que terá vigência já a
partir de janeiro de 2018, prevendo a suspensão do Imposto de Importação
(II), do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), do
PIS/Pasep-Importação e da Cofins-Importação. Segundo o texto aprovado na
Câmara e que seguiu para o Senado, todo o dinheiro investido em
produção de óleo poderá ser deduzido da Contribuição Social sobre o
Lucro Líquido (CSLL) e do Imposto de Renda de pessoa jurídica (IRPJ);
além disso, a importação de equipamentos para o setor passa a ser livre
de impostos. Só ano que vem a renúncia fiscal chegará a R$ 18 bilhões,
que deixarão de ingressar nos já combalidos cofres públicos. Aqui no
Acre, três dos oito Deputados Federais votaram a favor da MP 795, a
chamada “MP do Trilhão”: Flaviano Melo (PMDB), Jessica Sales (PMDB) e
Alan Rick (DEM).
Já o Senado Federal aprovou a PEC que cria o Fundo Nacional
de Desenvolvimento da Segurança Pública – FNDSP, proposta do conjunto
de Governadores reunidos no dia 28 de outubro, aqui no Estado do Acre,
sob a liderança do Governador Tião Viana, materializada na Carta de Rio
Branco.
A PEC prevê que o IPI e o ICMS devido pelas empresas do
setor bélico/armamentista será destinado ao Fundo. Um passo decisivo
para que as políticas públicas da área de segurança pública tenham
mecanismos semelhantes de co-financiamento às áreas de educação e saúde,
com o FUNDEB e o SUS, respectivamente.
Porém, tal proposta poderia ser ainda melhor, não fosse
pelo destaque apresentado pela bancada do PMDB: é que a redação original
da PEC previa que, além dos tributos das indústrias bélicas, 3% do
Lucro Líquido (LL) dos bancos e financeiras, bem como uma parcela do ISS
devido pelas empresas de segurança privada também fossem destinados ao
fundo.
E é aqui, na intersecção entre os dois temas,aonde residem
as contradições: o Governo Temer e todos as forças que o sustentam,
dentre elas as corporações da grande mídia familiar, tradicional,
conservadora e sonegadora de impostos do país, tem propagado que, para
conter a crise econômica e o déficit fiscal, são necessários sacrifícios
de todos; que o Estado precisa reduzir o seu tamanho, para economizar
em seu custeio; que é preciso cortar privilégios dos servidores
públicos, como os super-salários e outros benefícios; que é necessário
fazer a reforma da previdência e a reforma trabalhista, tornando mais
rígidos ou mesmo suprimindo o acesso ao exercício de direitos de há
muito consagrados e pacificados; que foi necessário aprovar a EC n. 95,
que limita o crescimento do orçamento (limitando assim novos
investimentos públicos, sobretudo em programas sociais de geração de
emprego, distribuição de renda e redução das desigualdades) pelos
próximos vinte anos e assim por diante.
O Estado é, de fato, agigantado, precisa reduzir seu
tamanho. A crise econômica existe, é verdadeira, e tem impactado
negativamente o orçamento público; o déficit fiscal, daí advindo, também
é verdadeiro, existe e medidas devem ser tomadas para ele ser contido.
Contudo, por que querer que apenas as camadas menos
favorecidas da população, os pequenos e médios empresários e
industriais, os pequenos e médios produtores da agricultura familiar e
os trabalhadores em geral paguem essa fatura? Por que deixar de fora da
reforma da previdência juízes e promotores, justamente as categorias que
mais gozam de privilégios no serviço público? Por que, na contramão do
sacrifício imposto aos mais pobres, com preços públicos, taxas e tarifas
de gás de cozinha, combustível e energia elétrica nas alturas, se
concede benefícios para os mais ricos e poderosos, como esse pacote de
isenções fiscais para empresas e bancos multinacionais, que estão entre
as maiores e mais lucrativas corporações do mundo?
Se a crise impacta e aflige a todos, por que apenas os que
mais precisam da força do Estado estão sendo chamados a pagar essa
conta, enquanto aqueles que menos precisam do Estado estão sendo
convidados a se isentar de sua parcela de responsabilidade?
A resposta é simples: porque foram esses, cujos privilégios
estão sendo mantidos às custas dos desvalidos e despossuídos que
financiaram o impeachment. Uma hora, a fatura ia ser cobrada, ainda que
as consequências sejam a destruição da economia nacional, com todos os
recursos orçamentários destinados para comprar deputados, se manter no
poder e continuar beneficiando os ricos e poderosos.
Espero, sinceramente, que os batedores de panela,
integrantes do MoroBloco, seguidores de pato inflável e outros inocentes
úteis estejam vendo e percebendo isso. Não cobro que eles vão às ruas
novamente: foram enganados, traídos, por aqueles que tanto ajudaram.
Disponível em: http://midianinja.org/danielzen/por-que-o-estado-isenta-as-grandes-corporacoes-e-nao-o-povo/
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