quinta-feira, 20 de outubro de 2016

PRISÃO DE CUNHA ABRE FASE DE INSTABILIDADE PARA TEMER

Por diversas razões, há interesse público numa delação do peemedebista.



A prisão do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ) abre uma fase de instabilidade política para o governo Temer que pode paralisar ou até ameaçar a sobrevivência da atual administração. Há dez dias, foi aprovada na Câmara em primeiro turno a PEC (Proposta de Emenda Constitucional) que cria um teto para limitar o crescimento das despesas públicas. O governo Michel Temer se fortaleceu e deu início a uma ofensiva política para aprovar medidas econômicas no Congresso. Com o impacto da notícia da prisão, a Câmara suspendeu suas atividades ontem. Não votou um projeto que desobriga a Petrobras de ser a exploradora única dos campos de petróleo do pré-sal nem conseguiu fazer sessão do Conselho de Ética. É natural algo assim no calor dos acontecimentos. A prioridade do presidente Michel Temer, que voltou ao Brasil, será evitar uma paralisação do governo, como já vimos em crises que aconteceram na gestão Dilma. Temer deve fazer um apelo aos líderes partidários para que não interrompam as articulações para votar a PEC do Teto e deverá pedir que acelerem os trabalhos. O melhor escudo contra uma crise política seria resolver ou amenizar a crise econômica. O recomendável seria apresentar logo a proposta de reforma da Previdência. Mas será importante ver os desdobramentos da prisão sobre as atividades do Congresso e do governo daqui em diante. Há temor no governo de que Cunha faça revelações que derrubem ministros e auxiliares de Temer. Também existe preocupação sobre a versão que Cunha apresentará da relação que teve com Michel Temer quando o atual presidente da República era vice e presidente do PMDB. Nos bastidores, Temer sempre disse estar preparado para combater eventuais ataques de Cunha e afirmou que não haveria nada comprometedor que o ex-presidente da Câmara pudesse revelar a respeito dele. A hora de enfrentar Cunha chegou, trazendo incerteza política para o atual governo.

Para complicar, haverá também uma onda negativa contra peemedebistas e tucanos com uma leva de novas delações _de executivos da Odebrecht, de Fernando Cavendish da Delta e complementos de colaborações da Andrade Gutierrez, por exemplo.

Interesse público
 
Cunha passou meses dizendo que jamais renunciaria à presidência da Câmara e o fez no início de julho. A prisão muda muita coisa. Até hoje, João Vaccari e José Dirceu, do PT, recusam a possibilidade de delação. Mas ex-diretores da Petrobras e o empresário Marcelo Odebrecht mudaram de ideia após negativas iniciais e decidiram falar. Portanto, uma série de razões apontam a colaboração premiada como a única saída eficiente para Cunha. A primeira é de natureza familiar. Ele estava preocupado com o que aconteceria com a mulher e uma filha, que são investigadas pela Lava Jato. Pode delatar para protegê-las. Há a gravidade das acusações e a quantidade de provas, sobretudo do material que veio da Suíça. Só uma delação poderia diminuir o tamanho de uma pena de prisão que deverá ser bastante severa.

Ninguém bem-informado tem dúvida de que Cunha sabe segredos de figuras centrais do governo, do Congresso, do PMDB, de outros partidos e de empresas com as quais lidou. Não deve ser levada a sério essa história de que o Ministério Público não teria interesse numa delação de Cunha. Não se trata de vontade pessoal de procuradores nem de um suposto desejo de castigar o peemedebista como exemplo de punição. Trata-se do que está na lei da delação. Se um criminoso revelar fatos novos e relevantes que ajudem a esclarecer delitos mais graves, ele preenche o requisito legal para delatar. Um acordo seria inevitável.

Em mais de 20 anos de uma carreira ligada ao submundo da política, Cunha atuou como corrupto e corruptor. Certamente, ele sabe de coisas que os investigadores ainda não descobriram. A prisão de Cunha ajuda o juiz Sergio Moro, procuradores da República e policiais federais a rebater a crítica de investigação seletiva contra o PT. Mas, até agora, foram os petistas os que mais sofreram com os efeitos da Lava Jato. Portanto, Cunha oferece aos investigadores uma oportunidade de combater tal crítica objetivamente. Temos de lembrar que Cunha demorou muito a ser preso. E isso permitiu que ele tivesse um papel central na queda de Dilma. Sem ele na ativa, o desfecho do processo de impeachment poderia ter sido outro. Por esse conjunto de razões, uma delação de Eduardo Cunha tem imenso interesse público.

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