É o fim do SUS, Mais Médicos, Saúde da Família, Farmácia Popular...
PHA: Eu vou conversar com Ronald dos Santos, presidente do
Conselho Nacional de Saúde. Ronald, vocês elaboraram um documento que
critica a PEC 241, por causa das ameaças ao Sistema Único de Saúde
previsto na Constituição de 1988. Qual é a maior ameaça à saúde na PEC
241?
Ronald: É a morte do Sistema Único de Saúde, um sistema
que salva milhões de brasileiros todo dia, um sistema do qual mais de
150 milhões de brasileiros dependem exclusivamente. Um sistema que
atende a todos os brasileiros, um sistema que será liquidado.
Ele já vive há algum tempo na UTI em função do crônico
subfinanciamento. Significa desligar os aparelhos. Significa a eutanásia
do maior patrimônio que o povo brasileiro conseguiu contratar na
Constituição de 1988.
Essa PEC congela os recursos por 20 anos. Simplesmente significa a
liquidação do Sistema Único de Saúde. Justamente por iso que estamos
chamando ela de "PEC da Morte".
PHA: Você poderia dar alguns números a esses seus argumentos?
Quanto significará, em subtração de recursos para a saúde, com o que
você chama de "PEC da Morte"?
Ronald: Mesmo com essa "cortina de fumaça" dizendo que o
congelamento só vai valer a partir de 2018 e em 2017 ainda vai ser 15%
das receitas correntes líquidas... Mesmo com isso, em 20 anos, até 2036,
significa uma retirada de 438 bilhões de reais da Saúde.
Isso do ponto de vista prospectivo, pra frente. Se nós fossemos
analisar pra trás, se essa regra tivesse valendo há dez anos atrás: ao
invés dos 100 bilhões que foram aplicados em 2015, seriam 69 bilhões. Ou
seja, uma diferença de quase um terço do recurso aplicado. Isso
significaria hoje menos UPAs, menos Farmácias Populares, menos
transplantes, menos cirurgias oncológicas, menos SUS...
Em última análise: muito menos vidas pro povo brasileiro. É isso que
significa a PEC. Mais do que números, são vidas. Quem perde uma vida,
que seja uma vida, é 100%.
PHA: Qual é o serviço que o SUS presta hoje que será mais prejudicado com a PEC 241?
Ronald: As forças políticas que defendem esse passo pra
trás defendem a tese do funcionamento de um sistema de saúde no qual
quem determina as regras é o mercado. É o que nós vivíamos no Brasil até
a Constituição de 1988. E nessa lógica, de Saúde como uma mercadoria, a
organização do sistema centra-se no hospital, no médico e na doença.
Sendo que a gente vai retornar a essa ordem presidindo a atividade
econômica de Saúde no Brasil, com certeza absoluta o que vai ser mais
prejudicado será a atenção básica. A atenção primária. A atenção que
resolve 80% dos problemas de saúde da população, com certeza será, a
médio e longo prazo, a mais prejudicada, pois ela vai na contramão dessa
lógica que estão tentando restabelecer. Ela parte da lógica que a Saúde
se faz no território, com uma equipe multiprofissional, e o centro dela
é na atenção primária, na primeira atenção, junto à comunidade, junto à
família.
E, em particular, quem mais vai sofrer, do ponto de vista da gestão,
serão os municípios que já estão super apertados, no sentido de um
compromisso das suas receitas com Saúde.
PHA: Pensando em pessoas, tente identificar para nós do Conversa
Afiada: quem são as pessoas que serão atingidas nessa descrição que você
acaba de fazer, e situando nos municípios que já estão com seus
orçamentos apertados, quem serão as maiores víticas dessa PEC que você
chama de "PEC da Morte"?
Ronald: Aqueles que sempre mais precisaram da atenção do
Estado: os idosos, as crianças, principalmente as mulheres, as
periferias das grandes cidades, o campo, as minorias... Essas que o
Sistema Único de Saúde tentou, através da integralidade e da equidade,
atender ao longo desse último período. Essas pessoas serão, por certo,
serão as mais prejudicadas e as que terão sérios prejuízos à atenção à
sua saúde. Não tenho a menor dúvida que quem mais vai sofrer as
consequências é, de fato, quem mais precisa.
E, no Brasil, são mais de 150 milhões de pessoas que dependem
exclusivamente do SUS - exclusivamente do Sistema Único de Saúde! Isso
não significa que os outros 50 milhões não dependam do SUS para consumir
uma comida saudável, para consumir água tratada, não usem as campanhas
vacinação, não usem os transplantes... É um sistema que nós temos que
atende os 200 milhões de brasileiros - mas, particularmente, 150 milhões
são exclusivamente dependentes desse sistema.
PHA: Nós noticiamos aqui no Conversa Afiada que o sistema Farmácia
Popular corre sério risco, porque não estão sendo feitas renovações dos
programas de farmácias com a Caixa Econômica Federal. Qual é o destino
da Farmácia Popular nesse governo que nós chamamos assim, singelamente,
de Golpista?
Ronald: Nós questionamos inclusive o Ministério da Saúde
e a informação que temos é que isso foi em virtude de um contrato com a
Caixa Econômica Federal que não tinha sido fechado. Mas a informação
que nós recebemos é que foi fechado esse contrato com a Caixa e, pelo
menos pra esse ano e para o próximo ano, está garantida a manutenção do
Farmácia Popular.
Mas nós estamos falando de mudanças pra 20 anos. E, nesse orçamento,
com essa proposta, com certeza absoluta não caberá a Farmácia Popular.
PHA: E o Mais Médicos?
Ronald: Quando você me perguntou qual que seria a área
mais prejudicada, eu lhe afirmei que seria a atenção básica, a atenção
primária, que é onde estão esses profissionais, é onde estão
estruturando a presença desses profissionais. Eu não tenho dúvida que,
presidindo novamente a lógica do mercado, a lógica da doença, o Mais
Médicos será um processo desestruturado pelo subfinanciamento, pela
falta de recursos.
PHA: O Mais Médicos pode acabar?
Ronald: Não tenho dúvida. Não só o Mais Médicos como
também pode prejudicar ou causar grandes dificuldades à própria
estratégia da Saúde da Família, que é algo que está há mais tempo e
estruturando a atenção primária de Saúde no Brasil.
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Disponível em: http://www.conversaafiada.com.br/brasil/a-241-e-a-pec-da-morte
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