Texto do nosso colaborador Yannick Teles.
Vivemos em uma era de Santa Inquisição moderna em que a moda agora é fazer acusações de homossexualidade. A “patologização” e demonização da homossexualidade está muito presente em nós. Em tempos de rede sociais não é muito dificil ver isso. Acusações de “homossexualidade” de outrem estão em cada comentário de foto ou vídeo postado por pessoas a mostrar carinho e afecto a alguém do mesmo gênero.
O caso mais recente (que eu vi) foi do actor Shemar Moore que postou uma foto em que ele carrega um amigo (gênero masculino) nos seus ombros, o famoso cavalinho, e choveu comentários do tipo “será que ele é gay?”, “Isso é muito gay” e coisas semelhantes.
O simples fato de ele ter carregado alguém do mesmo gênero que ele foi gancho para pôrem em xeque a sua sexualidade. Não vou falar de como as pessoas ainda insistem em entrar na vida dos outros, mas vou falar de algo que eu achei bem peculiar e interessante: o ator Shemar Moore e seu amigo, Marcus Smith, são dois homens negros, e a etnia/raça da maioria das pessoas que punham em xeque a sexualidade deles por causa da foto postada eram negras. Isso parece uma observação sem nexo, mas vamos a isso.
Os actores Ben Affleck e o Henry Cavill, os famosos Batman e Supermanrespectivamente, apareceram várias vezes a mostrar afecto na mídia, tanto na internet como na televisão. E era bem raro ler comentários a contestar a sexualidade dos mesmos depois de uma foto de um beijinho ou abraço carinhoso entre os dois. Eles obviamente eram só dois amigos que se gostavam muito e nada mais.
Alguns meses atrás, quando o ator Michael B. Jordan postou uma foto dele com o director de cinema, Ryan Coogler. Na imagem os dois estão próximos um do outro em um “neo-abraço”, o que foi mais que suficiente para chover comentários a contestar a sexualidade dos dois. Alguns diziam que a “pose era gay” entre outras coisas. Mais uma vez a etnia/raça das pessoas da foto e da maioria dos fazedores dos comentários era negra. Resumindo, homens negros não podem demonstrar afecto, carinho a outros homens (negros), porque consequentemente isso seria prova da homossexualidade dos envolvidos.
Para além de ainda haver uma demonização da homossexualidade, principalmente em comunidades e sociedades negras, nesses dois momentos podemos ver como facilmente é tirada a humanidade do homem negro. Aquela ideia estereotipada de machão alfa, durão, sem sentimentos que nossos queridos e amados colonizadores impuseram a nós, ainda está presente e é proliferada — e o mais doloroso é perceber que, muitas das vezes, por nós mesmos.
O homem negro (continental e em diáspora) ainda encontra a sua imagem exibida como a de um animal selvagem com insuficiência de sentimentos, e é levado a encarar isso como algo empoderador. “Olha sou machão, grandão, nervosão, com penis grandão e um total de zero sentimentos”. E essa imagem é tão frágil que qualquer coisa que ponha em dúvida essa super mega masculinidade nos faz tremer.
Parece que gostamos de ser objectos sem sentimentos, que não podem chorar, abraçar, beijar e demonstrar carinho a outro homem. Só podemos mostrar o how big, how strong, e what beasts [quão grande, quão forte e que vorazes] nós somos. Parece que não temos noção de como isso nos desumaniza e nos impede de poder compartilhar sentimentos, de falar da nossa vulnerabilidade sentimental e afectiva. Somos ensinados a perpetuar algo que nos oprime em uma totalidade. Temos na mente que mostrar amor por outro homem mancha nossa imagem e “dignidade”. Isso acaba fazendo com que nossas vidas de homens negros sejam superficiais pra caralho ao mesmo tempo em que nos faz amar essa superficialidade por que tememos sair da zona de conforto da masculinidade mestre.
Okay, que eu posso entender 0,001% do medo de sair da zona de conforto, de não receber mais atenção da supermacia branca ou do ocidente, porque o ocidente não dá atenção para homem negro com sentimentos, Isso esta fora de questão! A imagem que dá mais lucro é a do “thug”, homem negro completamente selvagem e brutal, que não tem sentimentos e só serve como objecto sexual e para afugentar os outros.
Por termos poucos recursos e referências, acabamos correndo para vestir esse esteriótipo. Por atenção, dinheiro, prestígio, mas tudp isso nos mata e esfarela a nossa humanidade. Temos que estar unidos, não há coisa bonita que mostrar carinho, afecto e amor por outrem. Seja amigo, irmão, pai, namorado ou marido, principalmente se esse outro for negro, porque isso quebra esse ciclo opressor de que somos sem sentimentos e que exteriorizar vínculos afectuosos para com outro homem (negro) é fatal.
Ame-se como negro e ame outros negros, esse é o lema, que podemos tirar da bela filosofia bantu(sul africana), Ubuntu.
Eu sou porque nós somos.
Disponível em: http://www.revistaforum.com.br/osentendidos/2016/06/27/homossexual-negro-new-bruxa/
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