terça-feira, 9 de maio de 2017

“EM UM PAÍS COM PASSADO DE ESCRAVIDÃO, A REGRA SEMPRE FOI EXPLORAR A MÃO-DE-OBRA”

Para Gabriela dos Reis Sampaio, professora do Departamento de História da UFBA e especialista em escravidão no Brasil, o PL proposto pelo deputado Nilson Leitão para reformar as leis trabalhistas no campo retira direitos dos trabalhadores, uma necessidade básica em qualquer país democrático.

Colheita de batata-doce biofortificada em Magé-RJ 
 
Dias após uma das maiores mobilizações contra as reformas da previdência e trabalhista , foi proposto pelo deputado federal Nilson Leitão (PSDB-MT), o Projeto de Lei PL6442/2016, que busca debater 192 pontos que ficaram fora da reforma trabalhista “oficial”. Entre os itens que ficaram fora do texto, está a possibilidade de remuneração em qualquer espécie, como alimentação e concessão de terras.
Para Gabriela dos Reis Sampaio, professora do Departamento de História da Universidade Federal da Bahia e especialista em História do Brasil Império, Rio de Janeiro e Bahia, Escravidão, Religiões Afro-Brasileiras, Cultura Popular, o PL retira direitos dos trabalhadores, uma necessidade básica em qualquer país democrático, e maior ainda em um país cuja história é marcada pelos costumes e leis escravistas. “O trabalhador rural, exposto de maneira mais direta a jornadas excessivas e exaustivas, ao desgaste físico e à violência costumeira das relações com proprietários de terra, certamente precisa de uma regulamentação ainda mais cuidadosa para garantir condições mínimas de segurança e saúde”.
O deputado Nilson Leitão afirmou que a proposta busca a modernização e desenvolvimento do setor. Além da mudança na forma de pagamento, o texto propõe que o empregado trabalhe 18 dias sem intervalo e revoga a Norma Regulamentadora 31, que garante que os empregadores forneçam aos empregados condições salubres para o exercício de suas atividades.
Segundo Gabriela, a justificativa do deputado é contraditória: “Ao se conhecer minimamente os ‘usos e costumes’ e a ‘cultura do campo’, qualquer pessoa com o mínimo de bom senso – independentemente de ideologia política – vai perceber a necessidade de proteger a integridade física do trabalhador rural, isso é, garantir salário digno, limites de horas de trabalho, condições mínimas de saúde, equipamentos de segurança, tempo de descanso, férias. Até para que o trabalhador produza mais. Afinal, até mesmo os senhores de escravo mais tacanhos, há mais de dois séculos, perceberam, com o tempo, que escravos doentes e exauridos se tornavam improdutivos”. 
Ainda segundo a professora, após a promulgação da Lei Áurea, nada foi assegurado em termos de direitos para os trabalhadores egressos da escravidão. A cultura da violência, inclusive de castigos físicos, da subordinação completa do trabalhador em relação ao empregador – com pagamentos em alimentação ou moradia, por exemplo – foi mantida, tendo sido imposta também a trabalhadores imigrantes que chegavam ao Brasil. “Em um país que teve mais de 300 anos de trabalho escravo, a regra sempre foi explorar ao máximo a mão-de-obra, considerada como uma mercadoria pelos empregadores, os senhores. O trabalhador era comprado pelo senhor que, para ter um retorno do investimento feito naquela transação, o chamado “comércio de carne humana”, fazia com que o ser humano adquirido trabalhasse em condições desumanas, até o limite de suas forças”.
O projeto deve começar a ser debatido por uma Comissão Especial da Câmara na próxima semana.

Disponível em:  http://brasileiros.com.br/2017/05/em-um-pais-com-passado-de-escravidao-a-regra-sempre-foi-explorar-a-mao-de-obra/

Nenhum comentário:

Postar um comentário