Viviany Beleboni foi a criadora e protagonista da manifestação
artística de maior repercussão na história das Paradas do Orgulho LGBT
no país. Ao vir crucificada sobre um trio elétrico, representou o
martírio de travestis e transexuais no Brasil, o país que mais mata
estas pessoas no mundo. Transfobia que sofreu ao ser esfaqueada no rosto
quando caminhava perto da casa onde mora.
Convidada pelos Entendidos, ela escreve aqui sua
visão sobre o trágico caso da travesti Dandara, morta no Ceará vítima de
tortura física e psicológica, levada ao local da execução em um
carrinho de obras como se lixo fosse. Tal absoluta crueldade representa a
visão desumana como as travestis são tratadas gratuitamente, chamadas
por homens e mulheres como travecos, sufixo que denota coisa menor, sem
valor. No texto abaixo, Viviani expõe esta dura realidade: Dandara
acabou morta em um tribunal cotidiano onde as travestis são condenadas
sumariamente ao escárnio, à coisificação.
Viviany Beleboni
Todos os dias que ponho meus pés para fora do meu apartamento, lembro
da frase que minha mãe me disse quando ela descobriu que eu não era
heterossexual cisgênero. “Eu amo você, e te aceito. O meu medo é o que
as pessoas vão fazer a partir do momento que você sai do portão de
casa…”. Sempre achei que ela estava exagerando, até crescer e entender o
quanto é difícil você ser olhada na rua como se fosse uma palhaça. As
pessoas riem na sua cara, apontam, fazem piadas, gritam e até pedras te
atiram.
Com o passar do tempo, as palavras da minha mãe fizeram sentido. O
terrível vídeo de Dandara representa as várias humilhações que eu e
amigos lgbts já passaram na vida por causa de um Executivo e Legislativo
omisso e corrupto que faz o país ser atrasado e que não investe em
educação. Faz as pessoas acharem que, por aparentemente sermos
“diferentes”, não podemos viver e ser tratados com respeito,
Todos somos diferentes em vários aspectos, seja cor, raça, etnia,
preferências de cores, comidas, gestos e atitudes. Nós todos somos
diversos. Mas algumas diferenças parecem incomodar mais que as outras.
Somos julgadas. A realidade é que tem muitas pessoas que não conhecem
nosso dia a dia e querem falar com propriedade sem conhecer.
Hoje em dia, o que mais vejo em redes sociais são pessoas julgando e
falando da vida das pessoas sem conhecer a realidade. Vivemos numa falsa
hipocrisia, pois os mesmos que nos atingem nas ruas com palavras baixas
, são os que procuram as travestis às escondidas. Os mesmos que não dão
oportunidade de emprego às travestis são os mesmos que as pagam na
calada da noite para manter a sua hipócrita família feliz e sua imagem
de macho alfa na “sociedade”. A pergunta é: quantas mais Dandaras
morreram por ignorância e hipocrisia ?
É fácil julgar quando se tem família presente, comida dentro de casa,
apoio familiar, emprego e bons estudos. Quero ver o que essas pessoas
fariam sendo expulsas de casa, muitas das vezes sem ter completado a
maioridade, e sequer conseguido terminar os estudos, o que fariam?
Apontar sempre é mais fácil em vez de se colocar no no lugar do
outro. O ser humano sempre opta pelo que é mais fácil, não gosta e não
faz questão de pensar. O mais fácil sempre é e será julgar.
Disponível em: http://www.revistaforum.com.br/osentendidos/2017/03/13/viviany-beleboni-dandara-e-o-tribunal-cotidiano-contra-travestis/
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