Manvendra Singh Gohil desafia os costumes da Índia, onde a
homossexualidade é ilegal: “Quero oferecer empoderamento social e
financeiro para LGBTs, para que eles sejam capazes de sair do armário”
Manvendra Singh Gohil, Príncipe gay da Índia
Um príncipe gay indiano abriu seu palácio, instalado num terreno de
quase 61 mil metros quadrados, para LGBTs em situação vulnerável, e
iniciou a construção de mais edifícios para abrigar um número maior de
pessoas. Esse ato, que já seria notável em qualquer lugar do mundo,
ganha peso quando se considera que na Índia a homossexualidade é
criminalizada e a homossexualidade permanece um dos grandes tabus da
sociedade indiana.
O príncipe Manvendra Singh Gohil é o filho do marajá Rajpipla, em
Gujarat, um estado do oeste da Índia. Ele tornou pública sua
homossexualidade em 2006, tornando-se o único membro abertamente gay da
família real indiana. O gesto fez com que ele fosse ostracizado pela
própria família. Gohil não se deixou abater, e fundou a Lakshya Trust,
uma organização dedicada a apoiar homossexuais e educar a população
sobre maneiras de se prevenir o HIV.
A notícia de que o príncipe havia declarado sua homossexualidade causou reações acaloradas na Índia; pessoas chegaram a queimar imagens suas
nas ruas. Gohil foi deserdado e rejeitado por seus pais. Sua própria
experiência serviu de inspiração para que transformasse o palácio de
Hanumanteshwar, construído em 1927, em abrigo para homossexuais e
transexuais que, como ele, foram rejeitados pela família.
“Se eu passei por esse tipo de situação, o mesmo pode acontecer com qualquer outra pessoa homossexual”, declarou ao jornal International Business Times.
“Na Índia, nós vivemos em um sistema familiar, e somos condicionados
mentalmente a estar sempre com nossos pais. No momento em que se tenta
sair do armário, nos dizem que vamos ser expulsos e que a sociedade vai
nos boicotar. A pessoa é banida da sociedade. E muitos são dependentes
financeiramente dos pais.”
“Eu quero oferecer empoderamento social e financeiro para as pessoas,
para que, com o tempo, elas sejam capazes de declararem que são LGBT
sem serem afetadas. Elas terão seu próprio sistema de segurança social.
Não vai fazer diferença se forem deserdadas por suas famílias.”
Gohil tem planos para que seu centro de acolhimento ofereça abrigo,
educação sobre a prevenção do HIV, cuidados médicos e treinamento
vocacional para seus hóspedes. No momento, o palácio já conta com dois
moradores: seu gerente, que é gay, e uma mulher trans.
Ser uma criança gay já é difícil, mas o príncipe conta que teve que
enfrentar desafios particulares durante a juventude por fazer parte da
família real da Índia. “Percebi que sentia atração por pessoas do meu
próprio gênero aos 12 ou 13 anos, quando comecei a amadurecer
sexualmente”, conta Gohil. “Eu sentia que era diferente dos outros
garotos, sentia um conflito interno, mas não entendia que era gay.”
Como é comum entre os membros da aristocracia indiana, os pais do
príncipe mantiveram-se distantes durante sua infância e adolescência.
Ele se casou com a princesa Chandrika Kumari em 1991, na tentativa de
ignorar a própria sexualidade, mas o casal se divorciou no ano seguinte.
Seus pais então tentaram encontrar profissionais que aplicassem um
tratamento de “cura gay” no príncipe Manvendra. “Para o azar deles, os
médicos compreendiam essa questão e tentaram explicar-lhes que isso era
perda de tempo”, lembra-se. “O culpado de tudo é a falta de
conhecimento. Nem mesmo pessoas com bom nível educacional, como meus
pais, ambos com ensino superior, haviam sido educadas com relação à
homossexualidade.”
Segundo o príncipe, no entanto, a intolerância contra LGBTs é
consequência da colonização britânica. Na cultura indiana tradicional,
pessoas trans, também chamadas de hijra, kinner ou
“terceiro gênero”, tinham um papel importante como conselheiras nos
palácios. O Qur’an também reconhece que Allah criou ambiguidades no
gênero, afirma. “Quando se lê sobre nossa história e cultura, percebe-se
que a homossexualidade está presente no Kama Sutra, e que vários
templos exibem estátuas e esculturas homoeróticas”.
A proibição da homossexualidade consta no artigo 377 do código penal
indiano, que condena atividades sexuais que vão “contra a ordem natural”
e é utilizado para perseguir homossexuais. Essa legislação é um fóssil
do tempo em que o Reino Unido dominava a Índia. “Não faz o menor
sentido”, revolta-se Gohil. “Somos uma nação independente há 70 anos, e
essa proibição não existe mais nem no próprio Reino Unido. No entanto,
ela continua valendo aqui.”
Há esperanças para Gohil e toda população LGBT da Índia: no ano
passado a Suprema Corte indiana decidiu que homossexuais e transexuais
têm o direito de expressarem sua sexualidade sem discriminação. Isso
abre brechas para que tenham início batalhas legais contra práticas
discriminatórias no país. Nesse meio-tempo, o príncipe pretende estender
seu ativismo por todo o mundo. “Minha missão é percorrer o globo, ir
aonde quer que eu seja chamado, tornando a causa algo central para a
sociedade. Como diz um ditado em sânscrito: vasudhaiv kutumbakam, ‘o mundo inteiro é uma família só’.”
Disponível em: http://ladobi.uol.com.br/2018/01/principe-gay-manvendra-singh-gohil/
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