Uma nova presidência de Lula poderia se tornar um salva-vidas para muitos políticos da direita incriminados pela Justiça que sonham com uma anistia geral.
O comentário é de Juan Arias, jornalista, publicado por El País.
O comentário é de Juan Arias, jornalista, publicado por El País.
Eis o texto.
Quando a direita envolvida na corrupção afirma, como acaba de fazer o presidente Temer, que “é melhor derrotar Lula
nas urnas que transformá-lo em vítima”, o que talvez esteja querendo
dizer é que, no momento atual, seria preferível para seu Governo que
Lula ganhasse as eleições. Essa direita sabe que, em vista da rejeição
da sociedade à corrupção, será difícil eleger um candidato que tenha
apoiado o Governo Temer.
Poderia parecer estranho, mas se Lula fora condenado e obrigado a sair da cena política, a maior orfandade poderia ser da direita. Foi, de fato, nos Governos de Lula e Dilma Rousseff
que a direita adquiriu maior peso político. Os principais ministros e
assessores de Temer já o tinham sido nos quatro mandatos da esquerda. Foi com o PT no Governo que a direita estendeu seus tentáculos em todos os órgãos do poder que hoje mantém.
Se Lula for impedido de disputar a presidência, é
possível que cresça um candidato progressista disposto a continuar
combatendo a corrupção. Por que essa direita temeria mais, por exemplo, a
ecologista Marina Silva ou o ultradireitista Jair Bolsonaro do que Lula? Ou um Joaquim Barbosa, um Ciro Gomes e até um Luciano Huck? Porque esses políticos alternativos a Lula não parecem dispostos a acabar com a Lava Jato. Bolsonaro já anunciou que, se ganhar, designará o juiz Sérgio Moro para o Supremo.
A direita que teme uma candidatura progressista que não seja a de Lula
sabe que, se ele voltasse ao poder, a luta contra os políticos
corruptos seria abordada de maneira mais benigna do que faria um
candidato com ficha limpa nos tribunais. Uma nova presidência de Lula
poderia se tornar um salva-vidas para muitos políticos da direita
incriminados pela Justiça que sonham com uma anistia geral. Ao mesmo
tempo, essa direita sabe que Lula voltaria a governar com ela mais à
vontade do que com qualquer outro de esquerda, já que
ele é visto mais como pragmático que como esquerdista. Se Lula ganhasse
outra vez certamente repetiria o pacto com o mercado, o empresariado e
os bancos, e colocaria, de novo, um liberal como o atual ministro da
Fazenda, Henrique Meirelles, à frente da economia e do Banco Central. Já tentou fazê-lo com Dilma, mas ela recusou.
Lula é um candidato que nunca infundiu medo na direita enquanto esteve no poder. Quando disputou as eleições em 1989 e perdeu para Fernando Collor de Mello, confessou que tinha sido melhor para o país já que “ainda não estava preparado para governar por ser muito radical”. Foi José Dirceu,
o dirigente do PT posteriormente condenado à prisão, que “pôs a gravata
em Lula”, como escreveu este jornal na época. Dirceu o fez cortar a
barba de sindicalista, vestir-se com elegância e reconciliar-se com os
valores neoliberais da economia. E ganhou duas eleições.
Fernando Haddad, um intelectual do PT especialista em marxismo, considerado o estepe de Lula, recomendou a ele que, desta vez, leve o PT mais para a esquerda. Lula
sabe, porém, que se voltar ao poder não poderá governar sem o apoio da
direita. O que deve ter agradado a Lula foi o golpe publicitário de
Haddad, que o batizou de “viagra dos brasileiros”. Pediu que, no Brasil,
essa pílula “tenha a cor vermelha de Lula”, o único político, segundo
ele, capaz de “devolver o tesão” aos brasileiros. A mensagem subliminar
de Haddad é clara: desde que Lula saiu, os brasileiros
ficaram impotentes para seguir adiante, teriam perdido seu fogo, algo
que só o ex-sindicalista saberia devolver.
Essa direita, órfã de candidatos, cujo sonho é apagar o incêndio da Lava Jato para poder sobreviver tranquila, sabe que Lula,
maleável por temperamento, seria mais compreensivo nos labirintos e
negociatas da velha política que qualquer outro presidente da esquerda e
até do centro. Poderia parecer um paradoxo, mas essa direita, com medo
de acabar na prisão, na qual figura meio Congresso, não choraria se Lula
fosse absolvido nesta quarta-feira e pudesse disputar as eleições. E,
melhor ainda, se ganhasse.
Disponível em: http://www.ihu.unisinos.br/575526-por-que-seria-melhor-para-a-direita-se-lula-fosse-absolvido
Nenhum comentário:
Postar um comentário