A Corte Interamericana de Direitos Humanos proferiu na terça-feira, 9 de janeiro, uma decisão
que foi considerada histórica pelos defensores das minorias sexuais, ao
determinar a seus países membros que reconheçam direitos plenos aos casais do mesmo sexo
e permitam a troca de identidade sexual nos registros civis. O tribunal
internacional, com sede em San José (Costa Rica), considerou
“necessário” que a figura do matrimônio
não se restrinja às uniões heterossexuais, apesar da forte resistência
demonstrada por grupos conservadores que exercem sua influência nos
países da América Latina e Caribe.
“O
Estado deve reconhecer e garantir todos os direitos que derivam de um
vínculo familiar entre pessoas do mesmo sexo”, afirmou a Corte, e para
isso considera pertinente utilizar a figura do matrimônio e não outros
formatos legais que poderiam prolongar a discriminação. A decisão foi
feita em resposta a uma consulta consulta realizada pela Costa Rica em maio de 2016.
O presidente da Costa Rica, Luis Guillermo Solís,
reagiu de imediato com satisfação e com o anúncio de um rápido
acatamento da sentença. Centenas de pessoas foram comemorar a notícia na
fonte da Hispanidad, localizada em uma rotatória na região leste da
capital, à qual costumam ir os torcedores de futebol para festejar os
triunfos da seleção costa-riquenha. Também houve críticas de alguns
setores políticos conservadores que consideram o decreto uma violação da
soberania nacional.
A vice-presidenta da Costa Rica, Ana Helena Chacón,
considerada pelos ativistas a principal defensora de políticas
igualitárias no Governo, comemorou emocionada a decisão por considerar
que estimula os países da região a tirar da invisibilidade centenas de
milhares de pessoas que se unem a outras do mesmo sexo ou que possuem
uma identidade sexual diferente no Registro Civil de seu país.
Ajuste legal
A opinião consultiva da Corte Interamericana tem implicações
que vão além da Costa Rica, porque seu acatamento é obrigatório para os
20 países que atualmente reconhecem a competência do tribunal
internacional, alguns dos quais já reconhecem o direito ao casamento
igualitário. O Centro pela Justiça e Direito Internacional
(Cejil), com sede em Buenos Aires, considerou a decisão “histórica”. “É
uma jurisprudência enorme para guiar os Estados americanos no
desenvolvimento de leis e políticas públicas que garantam os direitos de
todas as pessoas, em igualdade, e permitam superar a realidade de
discriminação e violência que sofrem as pessoas LGBTI”.
Segundo Jefferson Nascimento, assessor do Programa de Desenvolvimento e Direitos Socioambientais da ONG Conectas,
a decisão da Corte Interamericana constitui inegável avanço no
entendimento regional sobre identidade de gênero e matrimônio
igualitário. "Associando o direito à identidade sexual e de gênero ao
conceito de liberdade e possibilidade de todo ser humano de
autodeterminar-se e escolher livremente as opções e circunstâncias que
dão sentido a sua própria existência, a Corte IDH mandou uma mensagem
forte a todos os países sob sua jurisdição sobre o caráter violador de
direitos humanos de normas e práticas discriminatórias contra casais do
mesmo sexo e pessoas trans".
Dentre os países que reconhecem a competência da Corte,
apenas Brasil, Uruguai e Argentina reconhecem o casamento igualitário.
No Brasil, desde 2011, Supremo Tribunal Federal determinou que casais homossexuais têm os mesmos direitos e deveres
que a legislação brasileira já estabelece para os casais
heterossexuais. Em 2017, o STF decidiu ainda equiparar os direitos
sucessórios de uma união estável com a de um casamento civil, dando mais
um passo no reconhecimento igualitário do direitos entre casais gays e
casais heterossexuais.Apesar dos avanços na prática jurídica, o casamento
homoafetivo ainda não é reconhecido pela Constituição brasileira. O
Projeto de Lei do Senado 612/2011,
que altera o Código Civil para reconhecer a união estável entre pessoas
do mesmo sexo e possibilitar a conversão dessa união em casamento, foi
aprovado nem março de 2017 pela Comissão de Constituição, Justiça e
Cidadania (CCJ), e segue em tramitação.
A Argentina foi o primeiro país da América Latina a
reconheceu o casamento homoafetivo, em 2010. O Uruguai seguiu o
pioneirismo do país vizinho e reconheceu o matrimônio igualitário em
2013.
Os juízes da Corte destacaram a necessidade de que os países
comecem logo o ajuste de normas regulamentares ou legais que permitam
aplicar esse critério, apesar de ter reconhecido que pode levar tempo
por dificuldades burocráticas ou políticas. Afirmou de maneira taxativa
que devem ser evitadas considerações religiosas, por ser este um tema
próprio dos direitos humanos e não um assunto de fé ou crenças.
Colaborou Regiane Oliveira, do EL PAÍS
Disponível em: https://brasil.elpais.com/brasil/2018/01/10/internacional/1515624521_957175.html?%3Fid_externo_rsoc=FB_BR_CM
Nenhum comentário:
Postar um comentário