terça-feira, 19 de dezembro de 2017

SOBRAL: NOTA PÚBLICA DE REPÚDIO

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Os Movimentos Sociais, Instituições, Centros Acadêmicos e Grupos de Pesquisa e Extensão abaixo assinados reúnem-se para publicamente manifestar indignação ao projeto de lei nº 2154/2017, recém aprovado na Câmara Municipal de Sobral, mais precisamente no dia 12 de dezembro do corrente ano, que expressamente “proíbe as atividades pedagógicas que visem à reprodução de conceito de ideologia de gênero na grade de ensino da rede municipal e da rede privada do Município de Sobral -Ce”.
Referido ato normativo, fadado à Inconstitucionalidade, seja formal, em decorrência da usurpação de Competência privativa da União para legislar sobre normas gerais que digam respeito a diretrizes e bases da educação nacional, seja material, em virtude de seu teor contrário ao Texto Constitucional, retrata de maneira preconceituosa termos e conceitos sociais, demonstrando ignorância por parte dos vereadores acerca da temática, visto que, o conceito “ideologia de gênero” não existe, o que torna sua aprovação ainda mais grave, já que seu trâmite se deu ausente de qualquer embasamento de pesquisas de referência sobre a temática de gênero, tornando sua aprovação irresponsável. Além disso, nota-se também a ausência de diálogo com a sociedade civil, tampouco com instituições e/ou movimentos sociais representativos da comunidade LGBTQ, apesar da importância e complexidade do assunto abordado, bem como da repercussão prática e simbólica gerada.
A Carta Magna Brasileira prevê, no Art. 3.º, inciso IV, que constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, dentre outros, promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
O texto do projeto de lei amplamente repudiado remete à inaceitável censura explícita, cujas marcas e resquícios em nossa história democrática ainda se fazem vívidas, já que previamente priva o ambiente escolar do debate sobre identidade de gênero e orientação sexual, fenômeno social cuja realidade e existência não podem ser ignoradas no âmbito escolar. A educação, muito além de formar meros reprodutores de conteúdo, prepara o ser em formação para a vida em sociedade, ou seja, um elemento essencial para a formação da cidadania, além de ser instrumento de transformação cultural.
Com efeito, não abordar em sala de aula assuntos relacionados a gênero e sexualidade não os exclui da realidade social, mas tão só contribui para a alienação de crianças e jovens, por meio da perpetuação de tabus, preconceitos e estigmas, contribuindo com a manutenção da invisibilidade e vulnerabilidade destas “minorias”.
O debate, portanto, deve ocorrer não só na escola, mas deve transcender a todos os meios e segmentos sociais, de modo a desmitificar paradigmas alimentados pela ignorância e pela cultura de ódio. Debater assuntos relacionados a gênero e sexualidade é promover igualdade material através do esclarecimento e do conhecimento, de modo que o texto do projeto de lei combatido vai de encontro a preceitos constitucionais básicos de isonomia e não discriminação, ferindo a dignidade da pessoa humana.
A educação plural, com vistas à vida contemporânea, é não só um direito do cidadão, como um dever do Estado, conforme previsão do art. 206 da Constituição Federal, que preconiza, no que tange à educação: I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber; III - pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino.
O Brasil é o país que mais assassina LGBTs no mundo. Segundo dados da Rede TransBrasil e do Grupo Gay da Bahia (GGB), em 2016 foram um total de 144 mortes. Segundo informações da Associação Internacional de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transgêneros e Intersexuais (ILGA), o Brasil é também a nação que mais mata sua população LGBT nas Américas e que possui um altíssimo índice de violência contra as mulheres como observado no Mapa da Violência: Homicídios de mulheres no Brasil. As estatísticas apenas demonstram o atual quadro social destes grupos, que vivem marginalizados, assolados pela intolerância e pelo preconceito, em meio a uma cultura machista.
Uma educação esclarecedora é o meio hábil e eficaz para superar a violência e exclusão social que acompanham estes grupos, assim como construir uma sociedade menos conservadora e adoecedora. Permitir a participação da escola na formação cidadã dos jovens em fase de desenvolvimento é promover o respeito, além de estimular a auto aceitação daqueles que sofrem com as dores de se verem e identificarem de forma diferente ao culturalmente imposto e estabelecido como padrão.
Tomando-se, portanto, todas as considerações ora aduzidas, que não se pretendem a encerrar o debate da matéria, tampouco os motivos ensejadores do repúdio ao projeto de lei ora combatido, é o que os movimentos sociais e entidades aqui elencados reúnem-se em ato de resistência para conclamar deste gestor municipal seu veto, de modo a por fim a este temerário e anacrônico absurdo legislativo.
Conclamamos, ainda, a participação da sociedade civil ao debate e esclarecimento.
O veto implica em uma vitória inicial e momentânea de nossa resistência, implicando no nascedouro de uma pauta de discussões, debates e diálogos.



Sobral, CE, 19 de dezembro de 2017


Assinam esta nota:


1. Associação Cearense dos Estudantes Secundaristas (ACES)
2. ANPUH/CE
3. Centro Acadêmico de História/UVA
4. Centro Acadêmico de Letras /UEVA
5. Centro Acadêmico de Ciências Sociais/UVA
6. Centro Acadêmico de Química/UVA
7. Centro Acadêmico de Educação Física - CAEF/UVA
8. Centro Acadêmico Silvia Lana – Psicologia/FLF
9. Centro Acadêmico de Filosofia/UVA
10. Centro acadêmico de Psicologia Damião Ximenes Lopes/UFC
11. Centro de Umbanda Macaia do Caboclo Pena Verde
12. Comissão de Diversidade Sexual e de Gênero OAB-CE-Subseção Sobral
13. Comissão de Direitos Humanos da OAB-CE subseção Sobral
14. Coletivo VRRA
15. Consulta Popular
16. Comitê de Defesa da Revolução - CDR Sobral (grupo de solidariedade Brasil-Cuba)
17. Coletivo Cabeça Chata
18. Conselho Regional de Psicologia 11ª Região/ CRP 11
19. Colegiado de Psicologia/UFC Sobral
20. DCE/ UVA
21. Engenho Coletivo (Guaraciaba do Norte)
22. Fórum Cearense LGBT
23. Fórum Permanente dos Direitos Humanos/Sobral-CE
24. Grupo de Estudos sobre Violência e Cultura - GEV
25. Grupo de Estudos e Pesquisas Educação, Cultura e Sociedade – GEPE/UEVA
26. GEPECJU - Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Culturas Juvenis/UVA
27. IADE - Instituto de Apoio ao Desenvolvimento/UVA
28. Instituto CEHI - Coletivo de Estudos Históricos Ibiapabanos
29. Juntos
30. JS PDT Sobral/Ceará
31. Levante Popular da Juventude
32. Laboratório de Pesquisa e Práticas em Psicologia e Educação - LAPPSIE/UFC
33. LAEDES - Laboratório de Estudos das Desigualdades/UFC
34. Laboratório das Memórias e das Práticas Cotidianas - LABOME/UVA
35. Liga de Psicanálise e Psicopatologia/UFC
36. Movimento Estudantil de Pedagogia- MEPE
37. Movimento Reinventar
38. Núcleo Popular
39. PSOL/Sobral
40. PIBID- Letras Inglês/UEVA
41. PIBID - Ciências Sociais/UVA
42. PIBID – Pedagogia/UEVA
43. PCdoB Sobral
44. PET-Psicologia UFC
45. QUEER é ISSO - Grupo de Estudos e Pesquisas de Sexualidades e Corpo/UVA
46. Rede Emancipa/Sobral
47. Residência Multiprofissional de Saúde da Família
48. Rede de Pesquisa Nexos: Teoria Crítica e Pesquisa Interdisciplinar
49. SINDIUVA - Sindicato dos Docentes da Universidade Estadual Vale do Acaraú
50. Sindicato APEOC
51. Travessias/UFC
52. Transversar: construindo o cuidado na diversidade/UC
53. USES (União Sobralense dos Estudantes Secundaristas)
54. UJS/Sobral




Identidade Mandacaru

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