PARTIDOS EM DISPUTA PELO CAPITAL POLÍTICO DOS EVANGÉLICOS PARA 2018
Número de membros da religião saltou 61% em dez anos e criou um estoque de barganha eleitoral aos pastores.
Manifestantes na na Comissão Especial sobre o Estatuto da Família, apoiada pelos evangélicos, em 2015. Fabio Rodrigues Pozzebom Agência Brasil
Dois meses antes das eleições mais acirradas da história brasileira, a mandatária máxima do país e candidata à reeleição, Dilma Rousseff
(PT), uma ex-guerrilheira que já deixou escapar sua visão agnóstica, se
deslocou de Brasília até São Paulo para assistir a um culto evangélico
de quase três horas. A exposição foi marcada pela fala de um pastor, que
contou sobre a época em que fumava "até cem pedras de crack por noite".
"O vício é um espírito, um encosto, que domina o sistema nervoso",
explicava ele, já "curado pela fé", diante de uma plateia que, além de
Rousseff, reunia a nata do poder brasileiro: o então vice-presidente Michel Temer , ministros, o governador e o prefeito de São Paulo e os membros mais importantes do parlamento do país.
Naquele julho de 2014 eles participavam da inauguração do Templo de Salomão ,
a mega-igreja de 100.000 metros quadrados com capacidade para receber
até 10.000 fiéis construída no centro da maior capital do país pelo
bispo Edir Macedo, líder da Igreja Universal do Reino de Deus. A IURD,
sigla pela qual é conhecida, é uma das principais expoentes da religião
evangélica, doutrina que mais cresce no Brasil. Estava ali, naquela convenção suprapartidária ,
o retrato fiel da importância política que os evangélicos adquiriram no
país nos últimos anos. Ninguém pode correr o risco de desagradá-los, de
olho em um apoio para as próximas eleições.
Na última década, Macedo e as principais lideranças
evangélicas, que se multiplicaram diante de disputas e desentendimentos
internos, apoiaram o PT, em uma aliança antes improvável e que em muitos
momentos obrigou o partido de esquerda a recuar na adoção de pautas progressistas . Mas, no processo que levou ao impeachment de Rousseff ,
no ano passado, esses apoios foram ficando pelo caminho e o partido de
Luiz Inácio Lula da Silva acabou abandonado. A dúvida, agora, é para
onde esses apoios migrarão em 2018, em um cenário em que despontam as
preferências pelas ideias do militar reformado Jair Bolsonaro , que inclusive passou por um batismo evangélico em Israel no ano passado, e nomes do PSDB, em especial o do prefeito João Doria .
Dois meses antes das eleições mais acirradas da história brasileira, a mandatária máxima do país e candidata à reeleição, Dilma Rousseff
(PT), uma ex-guerrilheira que já deixou escapar sua visão agnóstica, se
deslocou de Brasília até São Paulo para assistir a um culto evangélico
de quase três horas. A exposição foi marcada pela fala de um pastor, que
contou sobre a época em que fumava "até cem pedras de crack por noite".
"O vício é um espírito, um encosto, que domina o sistema nervoso",
explicava ele, já "curado pela fé", diante de uma plateia que, além de
Rousseff, reunia a nata do poder brasileiro: o então vice-presidente Michel Temer , ministros, o governador e o prefeito de São Paulo e os membros mais importantes do parlamento do país.
Naquele julho de 2014 eles participavam da inauguração do Templo de Salomão ,
a mega-igreja de 100.000 metros quadrados com capacidade para receber
até 10.000 fiéis construída no centro da maior capital do país pelo
bispo Edir Macedo, líder da Igreja Universal do Reino de Deus. A IURD,
sigla pela qual é conhecida, é uma das principais expoentes da religião
evangélica, doutrina que mais cresce no Brasil. Estava ali, naquela convenção suprapartidária ,
o retrato fiel da importância política que os evangélicos adquiriram no
país nos últimos anos. Ninguém pode correr o risco de desagradá-los, de
olho em um apoio para as próximas eleições.
Na última década, Macedo e as principais lideranças
evangélicas, que se multiplicaram diante de disputas e desentendimentos
internos, apoiaram o PT, em uma aliança antes improvável e que em muitos
momentos obrigou o partido de esquerda a recuar na adoção de pautas progressistas . Mas, no processo que levou ao impeachment de Rousseff ,
no ano passado, esses apoios foram ficando pelo caminho e o partido de
Luiz Inácio Lula da Silva acabou abandonado. A dúvida, agora, é para
onde esses apoios migrarão em 2018, em um cenário em que despontam as
preferências pelas ideias do militar reformado Jair Bolsonaro , que inclusive passou por um batismo evangélico em Israel no ano passado, e nomes do PSDB, em especial o do prefeito João Doria .
Esse capital político evangélico foi construído ao longo de
décadas, seguindo a tendência de aumento do número de praticantes da
religião no país. Nos últimos dez anos, a quantidade de evangélicos
saltou 61%, segundo dados do último Censo do IBGE, de 2010, marcando uma
tendência contrária a seguida pela igreja Católica, que perdeu fiéis. É
uma massa de 42,3 milhões de brasileiros (22,2% da população), que,
segundo um Datafolha mais recente, já teria chegado a 32%. Um aumento
que se refletiu também na quantidade de evangélicos no parlamento
brasileiro. Se no final da década de 1980 eles conseguiram eleger 32
parlamentares com a campanha "irmão vota em irmão", nas últimas eleições
o número chegou a 77 (incluindo três senadores), segundo o Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (DIAP) .
A bancada do PMDB na Câmara, por exemplo, a maior da Casa, tem 60
deputados em exercício atualmente. "É razoavelmente barato eleger
parlamentares evangélicos. Os gastos são menores porque há a estrutura
da igreja para se usar na campanha", explica Ronaldo Almeida, professor
de antropologia da Unicamp e pesquisador do Centro Brasileiro de Análise
e Planejamento (Cebrap).
Essa mecânica sociopolítica criou um capital de barganha
para os líderes religiosos que se divide em duas frentes. A primeira é o
apoio no Congresso Nacional, que têm peso especialmente em votações
mais apertadas. E a segunda, a abertura de espaço nas igrejas para a
exposição de candidatos, ainda que antes das eleições, já que a
legislação eleitoral proíbe no período eleitoral —uma espécie de
propaganda gratuita que atinge milhares de pessoas e não tem limite de
tempo. No último dia 26, por exemplo, o prefeito de São Paulo, João
Doria (PSDB), que oscila entre disputar a presidência e o Governo do
Estado no próximo ano, esteve no palco da Assembleia Mundial do Poder de
Deus, controlada pelo apóstolo Valdemiro Santiago, ex-discípulo de Edir
Macedo, com quem brigou. Diante de uma plateia de 15.000 pessoas, o
prefeito, cuja taxa de aprovação caiu no mês passado ,
escutou o religioso afirmar que estava satisfeito com seu trabalho na
prefeitura, antes de fazer um apelo para que seus fiéis fossem mais
pacientes com os resultados de sua gestão. A exposição durou 13 minutos,
mais do que os 12 minutos e 45 segundos diários a que Doria teve
direito durante sua campanha para prefeito.
Doria é um dos nomes que pode receber apoio de boa parte dos
grupos evangélicos, caso decida concorrer em 2018. Em agosto, ele e o
governador Geraldo Alckmin, o mais cotado para a disputa pelo PSDB,
participaram da Expo Cristã e tomaram um café da manhã com líderes
evangélicos como o midiático Silas Malafaia, pastor da Vitória em
Cristo, uma vertente da Assembleia de Deus. Malafaia deu a eles um
recado: "Não vamos apoiar em nenhuma eleição quem apoia ideologia de gênero .
Essa é uma das maiores engenharias do diabo para destruir a família",
ressaltou o pastor. "Eu conheço o sexo macho e fêmea e não negociamos
nossos valores". Ao EL PAÍS, Malafaia afirmou que não gostou da resposta
pública de Alckmin após ouvir o recado. "Ele disse que é a favor do
amor. Então siga o caminho dele! Alckmin é um ensaboado", ressaltou
Malafaia.
Para o pastor, Doria teria mais chances com os evangélicos
por ser “liberal na economia e competente”, além de não estar citado em
nenhum escândalo de corrupção. Mas terá que mostrar o que defende nos
aspectos sociais. "Ainda não decidi quem apoiar. Mas existem algumas
coisas que são caras para os evangélicos e católicos praticantes.
Qualquer candidato que apoiar aborto, ideologia de gênero ou casamento
gay já perde o espaço", afirma o pastor." Acredito que, querendo ou não,
se Doria for candidato pelo PSDB já perde muito por causa do
envolvimento do partido com corrupção", ressalta ele, que é muito
próximo de outras lideranças evangélicas fortes.
Por ter posições claras e similares às defendidas por boa parte dos evangélicos ,
Bolsonaro deverá ter mais chances com os praticantes da religião. "Ele
vai capitanear grande parte do voto evangélico. Grande, grande, grande
parte", ressalta. "Não tem para ninguém, mais de 50% dos votos vai para
ele. Se o Alckmin for o candidato [no lugar de Doria], então, vai ser
90%", destaca.
Já para o deputado evangélico Ronaldo Fonseca (PROS), que
tenta criar no ano que vem um "partido cristão conservador", o Partido
Republicano Cristão (PRC), um nome da centro-direita seria a melhor
opção. Ele acredita que até janeiro conseguirá tirar a legenda do papel e
levar mais de dez deputados, hoje em diferentes partidos, para sua
agremiação, aproveitando-se da mudança da legislação que permite a
criação de novas legendas até seis meses antes das eleições. Fonseca é
ligado ao pastor José Wellington Bezerra da Costa, do Ministério do
Belém, um outro braço da Assembleia de Deus, a maior denominação
evangélica do país, e que também apoiou Rousseff à reeleição e a
abandonou antes do impeachment.
"A corrupção [do PT] ficou muito generalizada, muito
explícita", explicou Fonseca para justificar o abandono. "Muitos
evangélicos estão vendo no Bolsonaro uma forma de extravasar o que
pensam. Mas eu tenho muitas críticas a ele. Não acho que ele é
conservador. É radical. Representa um personagem e está aproveitando de
uma situação em que o Brasil está frustrado com a esquerda. Não é porque
eu sou contra o casamento gay que eu tenho que ser radical com os gays.
Não posso achar que toda polícia tem que matar. Isso não representa os
evangélicos", diz ele. O deputado não deixa claro quem o PRC apoiaria,
caso seja de fato criado, mas dá pistas que mostram a inclinação ao
PSDB. "Neste momento de transição que estamos vivendo, queremos que o
Brasil atravesse numa ponte já experimentada, que sabe que é segura, ou
queremos uma aventura?", afirma, enigmático. Mas e o apoio ao PT? "[O
partido] teria dificuldade", enfatiza.
O partido de Lula já trabalha com a certeza de que não
conseguirá o apoio da cúpula das igrejas e tenta apelar para as bases de
fiéis. Membros do partido têm se reunido em igrejas de bairro e tentado
apelar para os fiéis com o discurso de seu combate à desigualdade
social. O PT sabe que tem duas vantagens a seu favor. A primeira é que
uma recente pesquisa Datafolha mostrou que a taxa dos fiéis evangélicos
que segue a recomendação de seus pastores no momento de votar é pequena:
apenas 26%. E a segunda é que Lula tem melhor desempenho entre os mais
pobres, justamente a parcela que mais concentra evangélicos. Esta massa
de pessoas viu, ao longo dos anos, sua situação econômica melhorar e
costuma ser a mais afetada por políticas de austeridade, como as
implementadas pelo Governo Temer.
Disponível em: https://brasil.elpais.com/brasil/2017/11/29/politica/1511910263_276710.html?rel=str_articulo#1513105871240
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