De todas as crueldades impostas pelo governo ilegítimo de
Michel Temer, a reforma da previdência sempre pareceu a mais difícil de
ser concretizada. A rejeição popular sempre foi enorme e o governo não
conta com o mesmo apoio maciço do congresso como em votações anteriores.
Diante das dificuldades, foram feitas algumas mudanças no texto,
mas nada a ponto de alterar a essência devastadora dos direitos
previdenciários. Preocupado com a ameaça do PSDB abandonar a barca
furada governista, Temer convidou
o nobilíssimo senador Aécio Neves para fazer a articulação e conseguir
mais votos a favor da reforma. Não havia nome mais adequado para
comandar este ataque aos aposentados.
Mas a melhor estratégia encontrada
pelo governo até aqui foi gastar fortunas em propaganda. Mesmo em tempos
de arrocho, Temer enfiou a mão nos cofres públicos para iniciar uma
gigantesca campanha publicitária a favor da reforma. Só no primeiro
semestre deste ano, torrou aproximadamente R$100 milhões em publicidade para tentar torná-la palatável. Está funcionando.
Segundo pesquisa do DataPoder360,
a rejeição popular à reforma vem despencando. Em abril, 66% dos
pesquisados eram contra. Em novembro, a porcentagem caiu para 51%,
enquanto a aprovação subiu de 24% para 32%. Temer então decidiu
continuar investindo alto. Esta semana, deputados e senadores
autorizaram o governo a gastar mais R$99 milhões
em publicidade pró- reforma. Não se sabe se os meus amigos do MBL estão
abocanhando parte da bufunfa, mas, no ano passado, o grupo foi convocado
para ajudar a construir as estratégias de comunicação das reformas –
talvez venha daí o tom terrorista adotado pelas campanhas.
Querem nos fazer acreditar que a única alternativa além da reforma é a barbárie.
Além da propaganda oficial, os grandes
veículos de comunicação também não cansam de nos informar sobre o
tamanho do rombo e a urgência da reforma. O discurso é único, com
pouquíssimo espaço para opiniões divergentes. Querem nos fazer acreditar que a única alternativa além da reforma é a barbárie.
Em abril, uma CPI da Previdência foi
criada no Senado para investigar as contas da Previdência Social. Ela
foi assinada por senadores de todos os partidos, inclusive do PMDB,
apesar da pressão do governo.
O relatório final da comissão, aprovado por unanimidade, concluiu que
não existe déficit na previdência. O que existe é uma má gestão dos
recursos e uma enorme negligência na cobrança dos devedores, que deixam
de pagar para depois recorrer ao Refis. Empresas privadas devem R$450
bilhões e nem se preocupam em pagar porque sabem que não serão
incomodadas pelo governo. Só a JBS deve mais de R$1.8 bilhão para a previdência.
A conclusão da CPI não chega a ser uma
novidade, mas um fato chama a atenção: até mesmo os integrantes da
bancada governista concordam não haver rombo na previdência brasileira. É
um dado relevante, mas pouco se falou a respeito. Diferente do que
ocorre com a maioria das CPIs, que sempre estiveram sob holofotes, a da
Previdência não recebeu praticamente nenhuma cobertura da mídia, o que
talvez se explique pelo fato de que grandes anunciantes sejam também
grandes devedores. Os bancos, claro, são os que mais devem.
Os milhões gastos em publicidade são para escamotear essa realidade e empurrar para o trabalhador uma conta que não é dele.
A agenda pública do homem por trás da reforma, o secretário da Previdência Social Marcelo Caetano,
mostra quais interesses o governo pretende atender. Foram diversos
encontros com representantes de instituições financeiras, que são
grandes interessados em vender planos de previdência privada. Bancos
como Bradesco, Itaú e Santander, devedores milionários
da previdência (só o Bradesco deve quase meio bilhão), mantêm encontros
frequentes com o secretário. Houve até uma reunião com o MBL, mas não
há registro de nenhuma com entidades representativas dos trabalhadores
(exceto uma com a UGT, a central sindical amiga de Temer). A desfaçatez é tanta que, até ser denunciado em março deste ano, Caetano acumulava as funções de secretário da Previdência e conselheiro da BrasilPrev – uma das maiores empresas de previdência privada do Brasil.
Assim como Dilma não foi deposta por
pedaladas fiscais, o objetivo da reforma não é salvar o país da crise,
mas atender aos interesses do mercado financeiro. A conta da má gestão
desses recursos públicos será empurrada para o trabalhador, enquanto os
grandes devedores, que foram perdoados por todos os governos,
continuarão sendo preservados. Os bancos ainda serão agraciados com o
abocanhamento do mercado da previdência privada que irá bombar após a
reforma. É isso o que está em jogo. Os milhões gastos em publicidade são
para escamotear essa realidade e empurrar para o trabalhador uma conta
que não é dele. Um presidente que não foi eleito está gastando o nosso
dinheiro em propaganda para nos convencer de que a única saída para a
crise é o esquartejamento dos nossos direitos previdenciários. Esse é o
drama brasileiro.
Disponível em: https://theintercept.com/2017/11/26/a-reforma-do-mercado-financeiro-contra-o-povo-brasileiro/?utm_source=social_monitor&utm_medium=widget_vertical
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