Traduzido do relato de Mohammed Ashfaq para o site The Spectator
Não me surpreende que Keith Vaz, prestigiado parlamentar britânico da Câmara dos Comuns, foi pego na cama com garotos de programa.
Como garoto de programa que sou, eu sei que homens casados e gordos de
famílias asiáticas são nosso ganha-pão. A gente costuma brincar que, sem
os indianos e os caras do Oriente Médio, a gente ia falir. Eles sempre
são casados. Eu sempre sinto nojo pela maneira como eles traem suas
esposas, mas eles não me pagam para julgá-los.
Há diferentes tipos de garotos de programa. Alguns são muito jovens,
franzinos e lisinhos. Esses são os twinks. Eu sou moreno, peludo e
musculoso, o que atrai certos clientes que buscam um “homem de verdade”.
Eu faço programas há quase quatro anos, e já passei por centenas de
situações diferentes e esquisitas. Eu encontro homens de todas as idades
e de todo tipo. Eu sou chamado por advogados, homens de negócios etc.
Eu também saio com alguns políticos – da Câmara dos Lordes e da
Câmara dos Comuns. Tem um que tem um carro muito bacana, vem me buscar, e
daí me leva de carro para seu apartamento. Ele tem uma casa saindo de
Londres, mas usa seu apartamento em Londres para suas ligações
perigosas. (Isso é bem comum.) O sujeito é casado, mas não acho que
restou muito de seu relacionamento. Os políticos acham que eu não sei
quem eles são, mas eu não sou idiota. Eu assisto aos programas de
entrevista e aos noticiários.
Uma vez fui chamado por um membro da Câmara dos Lordes, um cara que
há muitos anos era casado. Antes de tornar-se parte da nobreza, ele era o
parlamentar que representava uma das áreas mais requintadas de Londres.
Ele me contou que, nessa época, vivia no armário. Ele era casado e
tinha um filho. Agora ele é avô e vive sua sexualidade abertamente. Eu
gostei dele. Ele não tinha interesse em penetração. Ele curtia mais
lutar mesmo. Esse foi uma forma de sexo seguro que ele adotou durante o
pânico do HIV na década de 1980.
Muitos dos meus clientes se preocupam muito menos com a Aids, e pedem
para fazer sexo sem proteção. Ou eles não se dão conta de que o HIV é
muito comum em Londres, ou esse risco dá tesão neles. Eles são malucos. A
maioria dos garotos de programa não cede. Aqueles que aceitam ou já são
soropositivos, ou estão desesperados para ganhar dinheiro – geralmente
porque estão viciados em drogas.
Eu sou gay e muçulmano e busquei asilo no Reino Unido. Eu vim parar
aqui porque meus amigos gays foram mortos no meu país natal. Minha
família não sabe por que eu ganhei asilo aqui, nem sabem que eu sou gay.
Meus familiares me perguntam sempre quando é que eu vou arranjar uma
esposa. Eu não vou me casar, apesar de que isso tornaria minha vida mais
fácil. É errado fazer isso com uma mulher. Me incomoda muito que as
pessoas ainda se casam porque estão com medo de aceitarem quem são. Isso
posto, homens no armário pagam bem e usam muitos garotos de programas,
então sem eles eu teria uma vida muito mais difícil.
O trabalho em si é muitas vezes bem entediante. Alguns clientes ficam
com a cabeça enfiada no travesseiro, outros estão tão chapados que mal
percebem o que está acontecendo. Muitas vezes eu pego meu celular e fico
mandando mensagens para meus amigos para ajudar a passar o tempo.
Na verdade todo o processo de ser um garoto de programa é um tédio. A
gente tem que ficar esperando sentado alguém chamar para atender. Todas
as manhãs eu entro no site de garotos de programa que eu uso e fico
esperando. Quando dá umas onze da manhã eu saio e vou pra academia.
Quando se recebe um chamado você tem que largar o que estiver fazendo e
atender, então fica difícil fazer muitos planos.
O período de maior movimento é domingo de noite. Acho que é porque os
caras já passaram o final de semana inteiro em casa com a esposa e os
filhos e já estão pirando. Chamar um garoto de programa é uma maneira de
compensar por ter passado o final de semana inteiro no shopping.
Quem trabalha duro ganha muito dinheiro. Londres está cheia de
pessoas com dinheiro para torrar. Alguns clientes regulares dão gorjetas
e presentes. Um amigo meu acabou de ganhar 10 mil libras em dinheiro de
um cara que costuma atender. Acontece muito de um cliente se confundir e
começar a te ver mais como um namorado que um garoto de programa. Esse
tipo de cliente te leva para viajar. Esse tipo de cliente pode ser bem
carente.
Eu não acho que Keith Vaz era assim. Mas ele se encaixa em outro
estereótipo: o do político viciado em se arriscar, que parece fazer tudo
para destruir a si mesmo. Por mais estranho que pareça, mesmo garotos
de programa imigrantes valorizam a democracia britânica e esperam que
seus parlamentares a tratem com respeito. Eu tenho um visto permanente;
em breve vou me naturalizar britânico, e então pretendo fazer faculdade.
Vou me estabelecer nesse país – que salvou minha vida.
Mohammed Ashfaq é um pseudônimo.
Disponível em: http://ladobi.uol.com.br/2016/09/confissoes-garoto-de-programa-muculmano/
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