Por Francisco Toledo
Em tempos de crise econômica e social, muito se fala sobre a necessidade do poder público encolher seus gastos — principalmente quando o assunto é política e políticos, da Câmara dos Deputados até os ministérios e poder judicial.
Porém, as próprias lideranças políticas que adotam esse discurso de “estado cada vez menor” e de gastos controlados, acabam pisando na bola quando o assunto é a Cota para Exercício da Atividade Parlamentar (CEAP).
A CEAP é uma cota única mensal destinada a custear os gastos dos deputados. Porém, trata-se de uma verba que na teoria serve apenas para o exercício da atividade parlamentar. Segundo consta no Ato da Mesa nº 43 de 2009, o Estado precisa bancar as despesas dos deputados quando o assunto é: passagens aéreas; telefonia; serviços postais; fornecimento de alimentação ao parlamentar; hospedagem; táxi; pedágio; entre outros.
Não é pouca coisa.
E parece que o polêmico deputado Jair Bolsonaro, do PSC, é um fã dos Correios.
Entre janeiro e junho deste ano, o deputado gastou exatamenteR$169.119,24 com o CEAP. O mês em que Bolsonaro mais utilizou do serviço foi exatamente junho, onde pelo menos R$75.902,77 foram gastos pelo deputado e por seus funcionários. Desse valor, pelo menos 47 mil foram utilizados para serviços postais.
Reprodução/Câmara
Se formos comparar o valor gasto por Bolsonaro com deputados como Jean Wyllys, do PSOL, podemos identificar uma enorme diferença.
O mês em que o deputado do PSOL mais gastou foi maioR$27.595,32. Desde janeiro até junho, Wyllys utilizou exatamente R$122.834,54 da sua cota — cerca de 40 mil reais a menos que o deputado Jair Bolsonaro.
O novo presidente da Câmara dos Deputados, deputado Rodrigo Maia (DEM), gastou 20 mil reais a menos que Bolsonaro entre janeiro e junho deste ano: R$144.436,04.
Seu próprio filho, deputado Eduardo Bolsonaro — que também é do PSC — gastou menos. Foram R$159.803,35 utilizados da CEAP pelo deputado eleito pelo estado de São Paulo — valor que ainda assim supera os de Jean Wyllys e do novo presidente da Câmara dos Deputados.

Em um ano, Bolsonaro gastou quase meio milhão de reais com CEAP

O número fica ainda mais surpreendente para Jair Bolsonaro quando somamos o valor gasto por ele no CEAP entre junho de 2015 e 2016.
Somando os meses, chegamos ao valor de R$ 455.003,19 gastos.
Assim como em junho deste ano, o mês onde o deputado do PSC mais gastou foi dezembro do ano passado. Foram cerca de R$75.621,36 utilizados, e mais uma vez com destaque para os serviços postais, nos quais o deputado e sua equipe gastaram cerca de 38 mil reais. Outros 25 mil reais foram gastos neste mês com “divulgação da atividade parlamentar”.
Reprodução/Câmara
O “amor” de Bolsonaro com os serviços postais não é de hoje.
Em reportagem de feveiro de 2014, a Folha de São Paulo já havia tocado no assunto, ironizando o fato do deputado ter gastado R$149 mil para reembolso de serviços postais no ano de 2013. Segundo a reportagem, Bolsonaro teria dito que “o gasto com postagem é necessário porque seu público alvo não tem o hábito de usar computadores”, se referindo a militares aposentados e pensionistas.
Poderíamos utilizar esse valor gasto por Jair Bolsonaro em apenas um ano de atividade parlamentar para construir quase metade de uma escola pública em São Paulo, dentro de uma área de 997,00m² e pensando em gastos com limpeza e movimentação de terra, fundação direta, estrutura de concreto, instalações elétricas e revestimento padrão. O custo total dessa escola seria de R$928.284,41, segundo especialistas na área.

Mas por que o foco em Bolsonaro?

O deputado é um velho conhecido da política por criticar o que ele chama de “despesas desnecessárias” do dinheiro público.
Em fevereiro deste ano, Bolsonaro atacou o que chamou de “financiamento público de casamento homoafetivo”, prometendo investigar o pagamento de R$228,4 mil para cerimônia de casamento de 192 casais homoafertivos em clube na Tijuca.
Em 2011, durante entrevista ao Portal UOL, o deputado chamou o programa de assistência social Bolsa Família de “um crime”. Assim como ele, políticos que seguem uma linha mais conservadora e de direita na Câmara dos Deputados, considera o programa criado pelo ex-presidente Lula (PT) uma forma de “manter as pessoas pobres na pobreza”, criticando o uso de dinheiro público vindo dos impostos para a realização de programas assistencialistas.
Lideranças que gastaram mais que Bolsonaro
Pesquisamos pelo menos duas lideranças de partidos e correntes políticas dentro da Câmara dos Deputados que gastaram mais que Jair Bolsonaro entre janeiro e junho deste ano.
Uma delas é Baleia Rossi, do PMDB, que teve um gasto de R$185.101,24 nesse período.
Já o deputado Afonso Florence, do PT, gastou um valor muito acima do que seu colega do PSC: foram exatamente R$223.545,87 gastos da CEAP entre janeiro e junho de 2016.
As lideranças dentro da Câmara dos Deputados costumam ter mais gastos do que o restante dos deputados, pelo maior número de viagens, reuniões, funcionários e serviços extras que geram custos.
Todas as informações utilizadas nesta reportagem estão disponíveis ao público no site da Câmara dos Deputados.

Francisco Toledo é co-fundador e fotojornalista pela Agência Democratize em São Paulo