Outro dia alguém publicou na internet uma montagem com a foto do Papa Francisco, segurando a férula (aquele cajado antigo, com a cruz em cima) e com esta frase: “Então você pensou que eu ia acabar com a ‘missa tridentina’?”. Sei que "tradicionalistas" não são muito inteligentes e a pulicação daquela foto revela, o quanto precisamos ir além do básico na teologia e na liturgia da saudável Tradição da Igreja. Precisamos nos embriagar do vinho novo e abundante, que jesus nos dá como um milagre (Jo 2) e "ser, para Deus o suave perfume de Cristo`(2cor 2,15), pois não existe “missa tridentina”, “missa de sempre”, “missa reformada”, missa nova e outras bobagens que costumamos dizer e ouvir, existe a Santa Missa, este grande e único diálogo com Deus, onde jesus Cristo nos dá seu "corpo como verdadeira comida e seu sangue como verdadeira bebida" (Jo 6,65).
Nunca me importei com o lugar onde as pessoas celebram a santa Missa, nem as roupas que usam, porque nunca vi nisso o problema, mas sim na concepção que se tem da Igreja, do Reino, de Povo de Deus, do sacerdócio, do serviço aos irmãos, da Redenção, da Eucaristia, do “Deus Conosco” e da fé daqueles que celebram o Deus vivo (cf. Jo 6,51; Mt 16,16; 1Jo 5,20; ) e da vida (Jo 10,1-14; 10,28;11,25-26)...
Penso que a dificuldade não está na posição em que se fica no altar, mas sim no modo de como compreendemos o Evangelho e de como o anunciamos e no testemunho que damos de Jesus Cristo Ressuscitado, e consequantemente, como compreendemos e vivemos a Santa Missa.
Voltar sempre de novo para Jesus Cristo, para o Evangelho, esta é a mensagem e a proposta sempre nova do Espírito, que faz novas todas as coisas (At 2,1-11; Sl 103/104; 1Cor 12,3-7.12-13; Jo 14,15-16.23-26). dizer que a forma de se celebrar é a de costas para o povo de Deus, para a Igreja, portanto para Deus mesmo, além de ser injusto e mal intencionado, demonstra que não se quer justamente isto: que o povo de Deus se apodere do Evangelho e faça uso dele, que o compreenda. Fazer com que o povo se apodere do Evangelho, esta é a tarefa que os Teólogos da Libertação assumiram e por isso que foram e são combatidos pelos “tradicionalistas”, assim como os fariseus e os “Doutores da lei” combateram a Jesus Cristo, fazer com que o povo de Deus é tarefa de todos os religiosos e ministros do Evangelho, pois como o próprio nome diz, são ministros, servidores, servos, e não senhores ou donos do Evangelho.
Não é mais possível viver a Igreja com este equívoco triunfalista pessimista que é a Igreja concebida pelos “tradicionalistas”, uma Igreja que agride as pessoas com atitudes de nervosismo e medo, de autodefesa, que vê o mundo como um adversário, que faz da condenação e da denúncia da teoria da conspiração todo um programa pastoral. Uma instituição marcada pelo restauracionismo e da passividade generalizada, sem atitudes de renovação, com o pecado da autorreferencialidade à flor da pele. Onde os bispos confundem liderança com autoritarismo e consideram-se líderes apenas quando os cristãos e as cristãs de suas dioceses estão submissos e silenciosamente obedientes. uma religião sem espiritualidade, que propaga uma mensagem morta para pessoas que não existem.
É necessário urgentemente retornar para Jesus Cristo. Não fazendo apenas uma reforma superficial, mas sim uma conversão ao Espírito de Jesus Cristo. Não apenas adesão doutrinal, mas seguimento. Não apenas mudanças, mas atualização da experiência fundante.
Este retorno à Jesus Cristo, ao Evangelho, esta conversão, este seguimento, esta atualização do primeiro chamado que Jesus Cristo fez aos Apóstolos e às Discípulas deve ser feito pelo povo, pois a hierarquia parece-me, não quer perder seus privilégios nem sair de sua cômoda mediocridade, por isso não tem interesse em provocar, motivar uma conversão e tampouco converter-se à Jesus Cristo.
Devemos retornar ao que é a fonte e a origem da Igreja. Deixar que o Deus encarnado em Jesus, o Filho de Maria, seja nosso único Deus. É preciso reformar e restaurar muita coisa, claro que sim, e fazer com que a doutrina seja a do Novo Testamento, mas, primeiro, é preciso voltar à fé em nosso Senhor Jesus Cristo. Invocar um clima mais humilde, mais prazeroso, porque, caso contrário, seremos cada vez mais uma instituição decadente, mais sectária, mais rara, mais triste, mais distante do que Jesus quis e pelo qual Ele deu a Sua vida.
Jesus Cristo deve ser um projeto de vida, quase uma obsessão, uma necessidade imperiosa, por ele devemos deixar tudo como segunda opção, ou melhor, além dele, nenhuma opção devemos ter (Mt 19,21-29; Mc 8,34-9,1). Senão será tarde demais. Deixamos quase morrer a Ceia do Senhor, a Missa, porque a Igreja não se questionou seriamente sobre a razão das pessoas saírem e buscar outras denominações, muitas vezes caindo nas mãos de mercenários da fé (Jo 10). Não houve uma “crise vocacional”, muita gente boa e abnegada quis e quer ser padre, dedicar todos os seus talentos e energias ao Reino, mas ao invés de acolhe-los e encaminhá-los, prefere-se ficar discutindo quem pode ou não pode ser ordenado, sem os critérios da justiça. Diocese só com o bispo, é uma aberração vergonhosa.
É necessário e urgente voltar a entender Jesus Cristo como o que Ele realmente foi e é e o percebemos no Evangelho: “Um Profeta poderoso em atos e palavras” (Lc 24,19). Percebê-lo, segui-lo e imitá-lo.
É necessário e urgente que a Igreja reconheça seus pecados e se responsabilize por eles, questione suas falsas seguranças, saia de sua zona de conforto, duvide da auto “santidade”, porque santifica tudo e não vê as trevas que há dentro dela, e assim não ilumina as trevas, não resplandece, é uma candeia colocada embaixo da mesa (Lc 11,33), um sal que já perdeu o sabor (Mt5,13).
Se a Igreja não escuta os clamores dos pobres, será surda. E, surda ficará muda. E, se muda não será capaz de anunciar o Evangelho de Jesus Cristo, o Evangelho livre e libertador, o único Evangelho que há.
É necessário e urgente reavivar o espírito profético do Movimento de Jesus Cristo. Não podemos nos resignar a viver uma religião cristã sem profecia comprometida com a realidade do Reino de Deus (Mt 3,2; 6,10; Lc 13,29; 17,20-21; 22,24-30; At 10,34-35).
É necessário e urgente uma presença mais ativa, indignada e atualizada da liderança cristã na sociedade, mas uma presença que se manifeste em serviço humilde e testemunho assumindo a agenda dos movimentos sociais, dos pobres, dos excluídos, e nunca, nunca mais, triunfalista. Esta presença deve esclarecer, por si só que a Igreja não é o mais importante, mas, sim, o Reino e que Jesus não nos mandou ir para a igreja, mas sim para o mundo (Mc 16,15; Mt 10,18; At 1,8; Mt 28,18-20).
É necessário e urgente uma renovação espiritual com renuncia, humildade, desapego e autêntica santidade dos lideres cristãos, deixando de lado carreirismos, vaidades, hipocrisias.
É necessário e urgente rememorar que o Cristianismo não é uma religião a mais, é uma religião profética, a religião do amor e da justiça, para construir um mundo mais justo, mais solidário, mais santo e esta justiça, solidariedade e santidade deve ser vivida e testemunhada antes pelo seu clero.
É necessário e urgente recuperar a compaixão. Pois ser compassivos é a única maneira de seguir Jesus Cristo e de nos parecermos com o Pai (Mt 19,21). A Igreja perdeu a capacidade de atrair as pessoas, porque não levou a sério o sofrimento dos inocentes e deixou de solidarizar-se com as angústias dos pobres.
Precisamos continuar buscando caminhos, a partir da Igreja que cada vez tem menos poder de atração, ou devemos recuperar o Evangelho de Jesus como única força para transmitir e engendrar a fé? Hoje, o Evangelho se encontra aprisionado no interior de uma Igreja em crise, por isso é necessário e urgente recuperar o protagonismo do Evangelho, porque é Evangelho que atrai, não os adereços das igrejas. é a mensagem de nosso Senhor Jesus Cristo o essencial, não os detalhes decorativos e, as vezes, que para tê-los, somos capazes de "vender nossa alma ao diabo".
Jesus Cristo no Evangelho é muito mais atual e real do que os sermões que nós, padres e bispos, damos. o Cristo nu na Cruz redentora é que deve ser olhado, não nossas longas vestes rendadas. Deus não está em crise, nem está bloqueado. Jesus Cristo é o futuro da Igreja, um futuro “apaixonante”, mas para isso é necessário e urgente que seja o presente, a realidade atual, assumida e vivida, Sua mensagem é necessária e urgente que seja vivida e testemunhada antes de ser proclamada, que o Evangelho seja pregado com a vida, mais do que com palavras, como disse São Francisco de Assis.
È necessário e urgente termos certeza do que somos: instrumentos de Deus, senão não teremos autoridade para pregarmos o Evangelho e ministrarmos os Sacramentos.
O Espírito está inaugurando um tempo novo. Um novo estilo de Igreja simples, pobre, humilde, próxima e dialogante, que se preocupa com a felicidade do ser humano, nesta e na outra vida.
Se o papa usa férula ou não, não é necessário nem urgente.
Se ele celebra de costas ou não, não é necessário nem urgente.
Se o Papa promove a mudança a partir de cima, nós devemos promover o Reino a partir de baixo, sem "papalolatria", mas focados em nosso Senhor Jesus Cristo e na Sua mensagem.
O Reino pretendido e anunciado no Evangelho de Jesus Cristo livre e libertador, o único Evangelho que há.
Isto sim é que é urgente e necessário...
Padre Antonio Piber
EREMITÉRIO FRANCISCANO DOMUS MARIAE
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