Secretaria da Educação de Juazeiro diz que a docente continua nas funções, mas ela está sem dar aulas em escola pública desde 20 de abril.
A Secretaria da Educação de Juazeiro do Norte informou, por meio de
nota, que não foi procurada pela docente e que a profissional continua
no exercício das suas funções. Já a professora e funcionários da escola
afirmam que ela está fora da sala de aula desde abril.
Maria registrou um boletim de ocorrência sobre crime contra o
sentimento religioso na Delegacia Regional de Juazeiro do Norte. A
delegacia da cidade apura o caso.
Segundo a professora, os alunos deixaram a sala dizendo sentir
mal-estar e forte dor de cabeça. Nenhum atendimento médico foi
solicitado pela escola, segundo a professora. O caso gerou uma
manifestação dos pais dos estudantes.
"Quando eu ia saindo na calçada comecei a ouvir gritos de 'sai
satanás', 'vou pegar essa feiticeira', 'ninguém pode mais do que Deus'.
Só via gente descendo de carro, gente olhando, populares vindo", conta a
professora.
Maria afirma que não recebeu apoio da direção ou de funcionários durante o ocorrido.
Com o ocorrido, o advogado da professora foi avisado de que a
instituição pretendia transferi-la para o setor burocrático. "Eles estão
colocando que eu não tenho mais condição de estar em sala de aula, isso
é uma forma de punição. Eu posso até ir [para o setor burocrático],
desde que a minha função seja fazer com que as escolas coloquem em
prática a Lei de Diretrizes e Bases, que diz que a educação tem
obrigatoriedade de ensinar a cultura africana", ressalta Maria.
Repercussão
O advogado e presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB de
Juazeiro do Norte, Rafael Uchôa, acompanhou a educadora até a delegacia
regional para registrar o fato. Ele confirma que o caso ganhou
repercussão na cidade.
Ao G1,
a Secretaria da Educação de Juazeiro alegou não ter tomado conhecimento
do ocorrido até o contato da reportagem. No entanto, no boletim de
ocorrência registrado pela professora, ela afirma que a secretária da
Educação de Juazeiro do Norte, Maria Loreto, compareceu à escola para
reunião com o colegiado.
A agente administrativa da escola, Adriana Ricarter, estava no local no
dia do ocorrido e foi quem deu assistência às estudantes. Pelo relato
dela, a diretora não estava na instituição quando tudo ocorreu, mas um
outro responsável, identificado como Cícero, chegou ao local momentos
depois. Segundo Adriana, Cícero repassou os fatos à Secretaria da
Educação.
Também de acordo com a agente, na segunda-feira seguinte ao caso, um
professor substituto foi enviado pela secretaria passou a dar aulas na
escola.
Cultura afro-brasileira
Lembrando a lei federal 11.645, sancionada em 2008, que torna
obrigatório o estudo da história e cultura afro-brasileira e indígena em
escolas de ensino fundamental e médio, públicas e privadas, Maria faz
críticas à escola por não cumprir as diretrizes.
"Na aula anterior eu trabalhei a cultura indígena e marquei pra
trabalhar as heranças de matriz africana naquele dia. Eu trabalho dentro
da lei 11645/08, porém, as escolas não. Aí quando chega no Dia do Índio
e da Consciência Negra fazem três desenhos e pregam na parede."
"Tive uma 'vibração de santo' dentro da sala de professores. Eles me
mandaram procurar um psiquiatra, disseram que eu não tinha capacidade de
trabalhar, chamaram o colegiado e assinaram abaixo-assinado pra eu sair
de lá", relata.
Segundo ela, a vibração de santo consiste em receber uma energia que
causa estremecimento no corpo e deixa a pessoa sem fala, sem consciência
de si e do lugar por um determinado tempo. A docente diz também ter
explicado previamente aos colegas de trabalho que poderia passar por
isso, já que sentia mal-estar naquele dia.
Antes dos dois episódios na escola de Juazeiro, Maria nunca havia
passado por situações semelhantes, mas afirma estar acostumada a lidar
com o "preconceito velado", já que costuma usar adereços que identificam
sua ligação com a religião africana, como colares de conta. "Venho
sentindo a rejeição nas escolas por onde passo, as piadinhas, o
isolamento..."
Disponível em: https://g1.globo.com/ce/ceara/noticia/professora-e-substituida-apos-dar-aula-sobre-religiao-africana-em-escola-no-ceara.ghtml
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