O atual presidente estadunidense se
notabilizou por seu ideário polêmico. Um deles se refere a já notória
posição anticientífica pela qual nega conclusões de cientistas
climáticos e dados científicos são censurados pelo governo. Infelizmente
essa perspectiva de anular as manifestações de especialistas,
principalmente quando estas são contrárias às suas crenças pessoais, vem
se espalhando para outros lugares, como por exemplo o Brasil.
Bem
no clima de paranoia que nos atinge, a segunda parte do título vem do
outro título do filme “Dr. Fantástico”, de Stanley Kubrick (1.964),
retratando a paranoia do outro como inimigo e as soluções
autodestrutivas para “salvar a civilização ocidental-cristã”.
Vejamos o fato a seguir descrito.
Uma bomba explodiu dia desses no metro quadrado mais caro da América Latina: no coração de Ipanema,
bastião da classe média alta do Rio de Janeiro. Segundo levantamento
preliminar, o método do furto coincide com o de organização criminosa
que em 2006 colocou de joelhos o governo de São Paulo,
que ao fazer acordo com ela após uma sedição contra o Estado, e
tornou-a hegemônica e a fez se espalhar para vários Estados da Federação
e até o exterior.
Nem se diga que a impunidade estaria representada por mais de 95% dos homicídios não serem apurados no Brasil.
A não apuração de um delito de tamanha gravidade não mudará com penas
draconianas: a falta de investigação mínima e eficaz tem maternidade e
paternidade: seu grau de fracasso quase absoluto decorre de uma
indústria de bate-volta entre os órgãos incumbidos da investigação
criminal.
Isso revela o
fracasso titânico da política de encarceramento em massa adotada no
Brasil: ao contrário das origens de várias organizações criminosas pelo
mundo[1],
as brasileiras foram criadas e gestadas por essa política insana, que
hoje elevou o Brasil à 4a maior população carcerária do mundo, com mais
de seiscentas mil pessoas encarceradas[2], 40% sem julgamento definitivo[3].
Que
fique claro: a visão majoritária da magistratura é reproduzir a visão
distorcida que faz crer que o juiz de direito deve ser um xerife, um
justiceiro, e não um garantidor da Constituição Federal.
Não
houve aplicação de qualquer política nos últimos vinte anos de
desencarceramento ou de aplicação de penas alternativas ao cárcere. Ao
contrário: a população carcerária aumentou 575% entre 1.990 a 2.014, como resultado primário do encarceramento em massa como política criminal.
Nessa
concepção hegemônica do juiz criminal, ele deve ser “implacável” com o
crime, condenar mais do que absolver, “compreender” os excessos das
forças policiais e reclamar dos limites impostos pela Constituição
Federal ao seu dever de “combater o crime”. Está adstrito à “lei e a
ordem”, não ao texto fundamental de qualquer país que se pretenda
civilizado.
Essa visão
produziu uma massa de miseráveis condenados por crimes contra o
patrimônio e tráfico de drogas, na lógica da proteção ao patrimônio numa
sociedade com a 9ª maior concentração de riqueza do mundo e da torta ideia da “guerra às drogas”, hoje em franco abandono por quem a engendrou, os EUA, que já legalizaram de alguma forma de maconha em 26 Estados,
enquanto o Brasil, provavelmente mantendo sua tradição histórica de
“último do mundo” (um dos últimos a abolir a escravidão, um dos últimos
na América Latina a declarar a independência) seguirá na burrice da
proibição.
Juntar mais
miseráveis em cárceres imundos e superlotados produz mais violência
porque o preso ao ingressar no sistema é obrigado a escolher uma facção
criminosa, já que o Estado permite, com conhecimento do Poder
Judiciário, que facções dividam unidades penitenciárias.
Essas lutam pelo poder num sistema abandonado pelo Estado, produzindo horrendos massacres que fazem o Brasil ser notícia negativamente por organizações de defesa dos direitos humanos e condenado pela OEA.
Essa
visão não científica do direito penal é uma bomba que explodirá na cara
da classe média apavorada, e os xerifes pedem a mãe de todas as bombas
para “combater o crime”: penas mais cruéis, mais graves, menos direitos
(como o Habeas Corpus) e mais condenações.
Trump, que evidentemente é partidário do encarceramento em massa, enviou sua MOAB (ao custo de quase meio milhão de dólares) para deter o terrorismo. As notícias da mídia ocidental informaram que inicial trinta terroristas haviam morrido. Dias depois, noventa.
O culto não era saber se essa notícia era verdade, nem se os mortos
miraculosamente eram todos efetivamente “terroristas” e o que implica
essa palavra.
A crença era
acreditar que essa medida – jogar uma bomba superpoderosa numa área
miserável – realmente poderia impedir o terrorismo. Como a crença é algo
íntimo e pessoal, não necessariamente comprovável, ao contrário da
opinião científica, a adoção da crença enquanto verdade política
representa o real terrorismo, o terrorismo psicológico da disseminação
do medo.
AJD-RIO – Associação de Juízes para a Democracia do Rio de Janeiro.
[1] ABADINSKY, HOWARD. Organized Crime, 11th ed., 2.017.
[2]
Roy Walmsley, World Prison Population List (London: International
Centre for Prison Studies, 2013), 11th edn), em
http://prisonstudies.org/research-publications?shs_term_node_tid_depth=27.
[3] Um das maiores do mundo, de acordo com o Ministério da Justiça da República Federativa do Brasil: http://www.justica.gov.br/noticias/mj-divulgara-novo-relatorio-do-infopen-nesta-terca-feira/relatorio-depen-versao-web.pdf, página 12.
Disponível em: http://justificando.cartacapital.com.br/2017/08/22/o-real-terror-o-terrorismo-psicologico-da-disseminacao-do-medo/
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