Mulher, lésbica e agora prefeita, Rênya Medeiros, 37 anos, venceu eleição em Passira, Pernambuco, por 116 votos, mas não utilizou a bandeira LGBT na disputa.
Rênya (E) contou com a colaboração da companheira Karla na disputa
eleitoral em Passira, na qual, segundo ela, precisou vencer a barreira
do preconceito. Foto: Peu Ricardo/DP
Mulher, ex-agricultora, lésbica. A prefeita eleita de Passira, município
com quase 30 mil habitantes do Agreste de Pernambuco, rompeu padrões
conservadores na Terra dos Bordados ao ser escolhida com a diferença de
116 votos para seu adversário. O caminho foi tortuoso para Rênya
Medeiros, 37 anos (PP). Segundo ela, envolveu atos homofóbicos, que
juravam o fogo do inferno para os eleitores dela. Ao custo de R$ 50 mil,
a campanha vitoriosa - e praticamente inusitada no estado - contou com o
apoio da companheira de Rênya, a universitária Karla da Silva, 26,
juntas há quatro anos.
Para os eleitores, no entanto, o valor de Rênya como candidata não
estava tanto na sua identidade sexual. A popularidade da ex-agricultora
cresceu proporcionalmente às entregas de água com carro-pipa promovidas
por ela há muitos anos no município. A ação só foi possível porque as
terras da família de Rênya têm fonte de água potável e, em Passira, o
líquido vale ouro.
A prefeita eleita faz parte de um grupo LGBT - o único de Passira - no
qual são discutidas políticas públicas para essa população. Mas o
programa de governo dela não aborda a temática como bandeira. O assunto
foi tratado de forma generalizada em meio à campanha, algo intencional,
reconhece a prefeita eleita: "Foi para não perder votos. A cidade é
conservadora. Muita gente dizia para os eleitores: 'Como você vai votar
em uma lésbica?' Como vai explicar para seu filho?'", lembra. Entre
religiosos, Rênya disse que houve até quem abrisse a bíblia para prever o
fogo do inferno para quem escolhesse a candidata como prefeita.
Os principais votos de Rênya, acredita ela, vieram de pessoas da
terceira idade. "Dou muita atenção a eles e acho que isso conquista os
idosos", diz a prefeita eleita, que é vereadora até o final do ano. A
vitória, mesmo que apertada, ela e a companheira acreditam que tem
relação com a grande rejeição do atual prefeito Severino Silvestre
(PSD). Pela primeira vez na história da cidade, o gestor não teria sido
reeleito. Ao todo, Rênya conquistou 10.013 votos contra 9.897 do
concorrente.
A prefeita eleita acha, ainda, que nem todos os eleitores acreditam que
ela é lésbica, como os opositores faziam questão de informar aos quatro
ventos. Afinal, Rênya foi casada com um homem.
"É como se as pessoas não acreditassem". Quanto a projetos para implantar políticas LGBT no município, Rênya silencia, pensa um pouco e diz: "Vou montar na prefeitura um grupo para discutir a realidade das pessoas LGBT. Tem quem ache que a gente não é normal, que não somos de Deus. Escutei muito isso. É preciso mais conscientização", pontua. Em Passira, diz ela, homens gays sofrem mais que as lésbicas. "Eles são o tempo inteiro apontados e xingados nas ruas. É mais agressão verbal", conta.
A história da ex-agricultura segue uma tendência nacional. Os municípios
pequenos foram responsáveis por quase metade das eleições de políticos
LGBT no Brasil, segundo levantamento da Associação Brasileira de
Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT). A entidade
contabilizou pelo menos 16 candidatos LGBT no país, sete deles em
cidades com menos de 100 mil habitantes. A nova prefeita de Passira não
está nessa listagem. Segundo a associação, a representatividade LGBT nas
urnas cresceu 1.916% desde 1996. Rênya não é minoria apenas sob esse
ponto de vista. Em Pernambuco, apenas 14% dos municípios contam com
gestão de mulheres no estado a partir do ano que vem.
Fonte: Diário de Pernambuco, por Marcionila Teixeira
Disponível em: http://www.umoutroolhar.com.br/2016/11/a-cidade-de-passira-no-agreste-de.html
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