quarta-feira, 3 de agosto de 2016

O DEUS DOS CANDIDATOS MORREU


Artigo publicado no jornal Correio Braziliense em 16.07.16
Antes da reforma eleitoral, que tirou o dinheiro dos empresários das campanhas políticas, qualquer candidato rezava para um Deus, no caso, o marqueteiro: o ser capaz de mudar a opinião pública por meio de seus milagres.
Temendo desobedecê-lo, o candidato, com medo de ser punido nas urnas, seguia à risca todas as instruções dessa divindade quase onipotente, por mais absurdas que fossem.
Assim nasceram grandes vitórias e fracassos. Maluf, por exemplo, disse um dia: “se Pitta não for um bom prefeito, nunca mais votem em mim”. Com isso, provou que arrependimento não mata.

Paulo Maluf (PP - SP) dá o seu voto de confiança para o candidato Celso Pitta (PP - SP)

https://www.youtube.com/watch?v=l6yokqnI9GQ


Campanha política no Brasil era sinônimo de dinheiro

A verdade é que campanhas são verdadeiros calvários para qualquer ser humano normal. A pressão por desempenhar um bom papel, sem erros, e obter os votos necessários é muito grande. Todos têm uma opinião para dar, uma receita mágica para o sucesso, principalmente as pessoas mais próximas ao candidato. Os marqueteiros tinham que, além de fazer o trabalho deles, não deixar que outros atrapalhassem.
O fato é que as campanhas brasileiras assemelhavam-se às grandes produções cinematográficas: programas de televisão em alta definição, com os melhores profissionais e equipamentos; planos de governo desenvolvidos pelos economistas mais renomados do país; artistas e influenciadores envolvidos em eventos e na campanha.
Para pagar uma conta desse tamanho, só com a ajuda de empresários, pois o fundo partidário, apesar de polpudo, não consegue cobrir as despesas de comunicação, mobilização e de ordem política.
Boa parte do dinheiro que financiava o Deus acabou. Inclusive, operações da polícia federal acabaram colocando alguns deuses no banco dos réus. É provável que marqueteiros de renome nem venham mais a se envolver com campanhas, agora que a fonte secou.
Em contrapartida, há o fim de uma limitação importante: a da exposição da pretensão de candidatura. Desde 2015, qualquer político pode se pronunciar como possível candidato a qualquer tempo. Portanto, se eu quisesse lançar minha candidatura à presidência em 2030, poderia divulgá-la hoje.

Reforma política: tudo o que os candidatos sabiam 

não vale mais


Na prática, o que a reforma eleitoral fez foi reduzir a importância das superproduções dos marqueteiros e aumentar a importância do trabalho contínuo. Os canais digitais dos candidatos são a nova televisão. Todo dia é dia de campanha.
Candidato que esperar o período eleitoral para fazer campanha está morto caso encontre um adversário que se preparou.
Em suma, tudo o que políticos aprenderam sobre comunicação eleitoral terá que ser revisto. A televisão tinha a repetição da mensagem enlatada em um visual de esperança como fórmula mágica do sucesso.
A forma de se comunicar deve mudar. A comunicação deve deixar de ser em massa para ser segmentada, algo que ainda não é bem compreendido. Por exemplo, não dá para falar de educação ou de segurança pública com jovens, profissionais e idosos da mesma forma, o que sempre foi prático na televisão.
O posicionamento midiático também precisa evoluir. No Brasil, fora exceções, candidatos sempre fugiram de questões polêmicas. Era fácil evitar falar de liberação do aborto, da descriminalização das drogas e de qualquer outra pauta que entrava em conflitos com segmentos.
Muitos políticos ainda pensam que quanto menor a exposição do que pensa, mais fácil será seu caminho eleitoral. Essa máxima era verdadeira quando a televisão concentrava o esforço de campanha. Nela, por pouco tempo, era possível fugir de assuntos e questionamentos.
Na web essa conduta não funciona. Internet não é televisão. Na televisão os expectadores não conseguem interagir com o conteúdo e nem escolher o que querem ver. Na internet as pessoas querem saber como o político pensa, quem ele realmente é e o que pretende. Menos frases motivacionais e mais trabalho.
O digital é cruel com o político que se mostra incapaz de tomar um posicionamento. A campanha de Marina Silva para a presidência em 2014 virou suco assim. Memes e vídeos mostrando a incoerência de seu discurso desconstruíram a candidata.
Fora isso, a web tem o poder de reviver defuntos. Aconteceu com Ciro durante a campanha política de Dilma em 2010.
Dois dias após ele assumir a coordenação da campanha petista, foi publicado um vídeo em que ele afirmava, dentre outras coisas, que Serra era melhor candidato que Dilma, que o PMDB era um agrupamento de bandidos e que o IBOPE vendia pesquisas. No dia seguinte, deixou o cargo.

CIRO GOMES, CABRA MACHO CONTA VERDADES SOBRE O PT

https://www.youtube.com/watch?v=pOO1M8OZpEI

Lula também foi lembrado por uma declaração sua em vídeo, dizendo ser contra o assistencialismo do governo Fernando Henrique, afirmando que projetos como o Bolsa Família eram para “calar a boca do povo com comida”.


Lula explica a finalidade eleitoreira dos assistencialismos do tipo Bolsa Família

https://www.youtube.com/watch?v=aq2NvLcuYvo


Em outro vídeo, Bolsonaro, muito antes de imaginar-se candidato à presidência, afirma que fecharia o congresso no dia seguinte de uma possível eleição para Presidente. Isso quebra qualquer chance de captar votos de pessoas que não são doentes por ele, inviabilizando sua eleição majoritária.

Bolsonaro: "Sou favorável à tortura. Só vai mudar com guerra civil, matando uns 30 mil"

https://www.youtube.com/watch?v=-fMdCwlwg8E




Marcelo Vitorino

Marcelo Vitorino

Consultor e palestrante de comunicação, marketing digital e gestão de crise na internet. É professor na ESPM-São Paulo, dos cursos “Marketing Político Eleitoral: a vez do digital” e “Estratégias Digitais para Resultados” e no MBA do IESB -Brasília, na disciplina Marketing Político em Ambientes Digitais. E também uma versão online para candidatos e profissionais: http://prevenda.presencaonline.com Sócio da Presença Online. Também conhecido nas redes sociais como "urso".

Disponível em:  
http://alemdamidiasocial.com.br/deus-candidatos-morreu-campanha-politica-marketing/

Nenhum comentário:

Postar um comentário